sábado, 28 de maio de 2016

Batalha de Verdun simboliza absurdo da Primeira Guerra

Durante 300 dias de 1916, alemães e franceses se confrontaram com violência inaudita às margens do Mosa, resultando numa carnificina com centenas de milhares de mortos e sem sentido estratégico nem vencedores reais.

O rugido da artilharia pesada começa de manhã cedo: por nove intermináveis horas os alemães disparam armas de todos os calibres. O mundo nunca vira algo igual: a 200 quilômetros de distância ainda se ouvem os canhões de Verdun. "Tempestade de aço" é como o escritor Ernst Jünger denominaria esse horror.
O 21 de fevereiro de 1916, início da ofensiva que os alemães chamaram de "Operação Tribunal", não foi um dia normal de guerra. Os combates já duravam um ano e meio na Europa, mas a Batalha de Verdun viria a se tornar o símbolo mais eloquente da Primeira Guerra Mundial (1914-18).
Lá 162 mil franceses e 143 mil alemães perderam a vida: uma média de 500 mortos por dia do lado da Alemanha, mais ainda do outro lado. Na maioria dos casos não se trata de caídos em combate no clássico sentido militar: a violência das armas esfacela, explode, pulveriza os soldados.

"Sangria" de peso psicológico

Até hoje o sentido da ofensiva germânica continua sendo um enigma. Mas Erich von Falkenhayn, chefe do Estado-maior alemão, forneceu uma explicação: Verdun seria uma "bomba de sangue", com o fim de aplicar uma sangria nos franceses.
Também perdura até nossos dias o debate sobre por que o local escolhido terá sido o acidentado terreno ao longo das margens do Rio Mosa, que faz uma curva em Verdun. Peritos militares são unânimes em apontar que – mesmo se fosse tomada pelos alemães – a cidade não seria um bom ponto de partida para investidas mais profundas em direção a Paris, localizada a 250 quilômetros de distância.
De fato, a meta de Von Falkenhayn com essa batalha não era nem um avanço nem um cerco, mas literalmente esgotar o sangue dos franceses, "sangrar até ficarem brancos", como definiu o general alemão. Um cálculo cínico, já que, para a França, Verdun era bem mais do que um nó estratégico-militar.
Como explica o historiógrafo Herfried Münkler, a cidade na região da Lorena representava "um símbolo da oposição franco-alemã". Lá pela primeira vez o Império Carolíngio fora dividido em três, no século 9º. Mais tarde, no fim da Idade Média, se formaram a partir daí a França Oriental e Ocidental. Local de grande significado psicológico para os franceses, Verdun não podia, sob hipótese alguma, cair nas mãos do inimigo.

General Pétain envolve a nação inteira


Entretanto, o defensor da cidade, general Philippe Pétain, percebeu a intenção de Von Falkenhayn, contrapondo-lhe uma astuta tática. Ele envolveu literalmente toda a nação francesa na batalha no leste do país, mobilizando mais de 70% de seus soldados para as trincheiras de Verdun, pelo menos uma vez, por um período de oito e dez dias.
Com esse princípio rotativo, Pétain realizou uma jogada de xadrez com amplas consequências: quase todas as famílias da França estavam de alguma forma presentes no local da batalha. Sobretudo entre fevereiro e junho de 1916, contingentes importantes do Exército nacional concentraram-se lá.
Mesmo em retrospectiva, parece inimaginável o poder de fogo gerado por essa guerra industrializada que se travava pela primeira vez. Calcula-se que, em menos de 30 quilômetros quadrados, foram disparados 10 milhões de tiros, com um peso total de 1,35 milhão de toneladas de aço. O estrondo deixou muitos surdos, e aos sofrimentos dos soldados logo veio se somar um mau cheiro indescritível.

Carnificina disfarçada de vitória

Verdun transformou-se num polo de extrema concentração de violência em espaço reduzidíssimo. As substâncias de combate empregadas deixaram a área contaminada por décadas, com certos trechos declarados zone rouge – zonas interditadas.
Essas foram algumas das cicatrizes duradouras de uma orgia de destruição material e de vidas humanas que em nenhum momento rendeu mais de quatro quilômetros de terreno conquistado para os dois exércitos.
A partir de julho de 1916, após o fracasso de várias ofensivas alemãs menores, o general Von Falkenhayn ordenou "defensiva estrita", pois há muito as tropas nacionais eram necessárias em outros focos de combate, sobretudo no Rio Somme, no front ocidental.
Em outubro os franceses avançaram, retomando, até dezembro, quase todos os territórios perdidos. Essa aparente vitória, contudo, fora na realidade um empate militar ao preço de uma catástrofe humana sem precedentes. E o início de um culto memorial que se mantém cem anos depois.

Símbolo da estupidez da Primeira Guerra

Entre os incontáveis monumentos aos 300 dias de Verdun, nenhum é tão impressionante quanto o Ossário de Douaumont, erguido em 1927 diante do forte mais poderoso e setentrional da zona de batalha. Na torre principal dessa sepultura de massa jazem os restos mortais de cerca de 130 mil soldados franceses e alemães, todos desconhecidos. Até hoje ainda são depositados lá ossos da época, achados por acaso em jardins, campos e bosques da região.

Para a França e os franceses, a catástrofe de Verdun é superposta hoje pelo sentimento de vitória, uma vitória de defensiva, segundo o lema de Pétain: "On ne passe pas!" – "Aqui não se passa!"
Para os alemães, em contrapartida, ela permanece como símbolo da total falta de sentido. Ainda assim não faltaram esforços para glorificar a posteriori a carnificina. Um exemplo são os 14 volumes de Die unsterbliche Landschaft – Die Fronten des Weltkrieges (A paisagem imortal – Os fronts da Guerra Mundial), de Erich Otto Volkmann, lançado em 1934-35, logo após a ascensão dos nazistas ao poder.
Além dos números astronômicos de suas vítimas, a Batalha de Verdun permanece na memória mundial também por motivos estratégico-militares, como um cínico exemplo de uma estratégia desumana.
Como analisa o historiador militar German Werth: "Ao contrário da 'batalha de movimento' no Rio Marne, a batalha no Mosa foi marcada por falta de imaginação e monotonia, fazendo dela um símbolo perfeito para a estupidez assassina de quatro anos de uma guerra de posições."

Fonte: Deutsche Welle
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