A Base Industrial de Defesa (BID) é um pilar fundamental da soberania nacional, envolvendo a produção e desenvolvimento de equipamentos e tecnologias essenciais para a segurança do Brasil. Nossa indústria de defesa é regulamentada por um conjunto robusto de leis e normas que visam proteger os interesses estratégicos do Estado, a integridade de suas tecnologias e garantir a participação de empresas nacionais na BID. Neste contexto, abordaremos as características das Empresas Estratégicas de Defesa (EED), a participação estrangeira na indústria, a propriedade de tecnologias, e desmistificaremos alguns mitos associados ao setor.
Empresas Estratégicas de Defesa (EED)
As Empresas Estratégicas de Defesa são definidas pela Lei nº 12.598, de 18 de março de 2012, que cria o Sistema de Gerenciamento da Tecnologia da Informação e Comunicação (GTIC) e estabelece os princípios para a atuação de empresas que operam no setor de defesa. De acordo com esta legislação, as EEDs têm o compromisso de atender às necessidades das Forças Armadas e outras instituições de segurança pública, garantindo a autonomia do país em relação a suprimentos e tecnologias críticas.
Um aspecto fundamental da legislação é a exigência de que as EEDs tenham participação majoritária brasileira. Essa diretriz é crucial para assegurar que o controle das tecnologias e processos estratégicos permaneça sob a tutela de interesses nacionais, evitando a transferência irrestrita de conhecimento e recursos para o exterior. Essa condição é expressa no artigo 6º da Lei nº 12.598, que estabelece que as EEDs devem estar sob controle de uma pessoa jurídica com sede no Brasil, e que a maioria das ações com direito a voto deve pertencer a brasileiros ou a empresas brasileiras.
Participação Estrangeira na Indústria de Defesa
A participação de empresas estrangeiras na base industrial de defesa brasileira é regulada principalmente pela Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. Esta legislação estabelece normas gerais para licitações e contratos administrativos e inclui disposições específicas para o setor de defesa. A participação estrangeira em projetos de defesa requer a observância de certos critérios, que incluem a comprovação de que a presença estrangeira trará benefícios diretos ao Brasil, como a transferência de tecnologia, a geração de empregos e a capacitação técnica.
Além disso, a Resolução nº 1, de 24 de janeiro de 2013, do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), determina que as empresas estrangeiras que desejam participar da BID devem demonstrar sua disposição em colaborar com o desenvolvimento tecnológico local. Isso pode incluir o fornecimento de conhecimento técnico, a realização de treinamentos e a criação de joint ventures com empresas brasileiras.
Propriedade de Tecnologias e Mitigação de Riscos
Um dos mitos comuns é que a aquisição de empresas estratégicas, como a Avibras, por investidores estrangeiros resultará na perda de tecnologias críticas para o Brasil. No entanto, essa ideia é um equívoco. O Decreto nº 9.073, de 5 de julho de 2017, estabelece que a transferência de tecnologia para o exterior deve ser autorizada pelo governo brasileiro e que deve ocorrer em condições que não comprometam a segurança nacional.
Ademais, a Lei nº 12.683, de 9 de julho de 2012, impõe a obrigação de que as empresas que desenvolvem produtos para a defesa mantenham seus conhecimentos e tecnologias no Brasil, mesmo em caso de venda ou fusão. Esta lei reforça a ideia de que as tecnologias estratégicas devem permanecer sob controle nacional, independentemente da estrutura acionária das empresas envolvidas.
A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) também desempenha um papel importante na regulamentação da transferência de tecnologia. A ABDI, em parceria com o Ministério da Defesa e outras instituições, promove políticas que incentivam a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico no Brasil, assegurando que as tecnologias adquiridas por meio de parcerias internacionais beneficiem a indústria local.
A Importância da Autonomia Tecnológica
A autonomia tecnológica é um conceito central na regulamentação da indústria de defesa no Brasil. A Estratégia Nacional de Defesa (END) estabelece diretrizes que visam garantir que o Brasil possa desenvolver e manter suas capacidades tecnológicas sem depender excessivamente de fornecedores estrangeiros. Essa estratégia busca minimizar riscos associados à segurança nacional, promovendo a pesquisa e o desenvolvimento de soluções inovadoras dentro do país.
O governo brasileiro tem investido em programas de pesquisa e desenvolvimento que envolvem universidades, institutos de pesquisa e a iniciativa privada. O objetivo é criar um ambiente propício para a inovação e a capacitação técnica, assegurando que o país possa atender suas necessidades de defesa de forma autônoma. A atuação integrada entre governo, academia e setor privado é fundamental para fortalecer a base industrial de defesa e impulsionar a competitividade do Brasil no cenário internacional.
Desafios e Perspectivas Futuras
Apesar das regulamentações existentes, a indústria de defesa brasileira ainda enfrenta desafios significativos. A necessidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento, a falta de incentivos fiscais e a burocracia são obstáculos que podem limitar o crescimento do setor. Além disso, a crescente concorrência internacional e a evolução das tecnologias de defesa exigem que o Brasil esteja preparado para se adaptar e inovar.
O investimento contínuo e a previsão orçamentária estável para as Forças Armadas são fatores cruciais para o desenvolvimento da Base Industrial de Defesa (BID) no Brasil. Um orçamento de defesa bem estruturado e previsível não apenas garante a modernização e a capacidade operacional das tropas, mas também cria um ambiente favorável para que empresas nacionais invistam em pesquisa e desenvolvimento. Essa segurança financeira permite que a indústria de defesa inove e produza equipamentos e tecnologias de ponta, reduzindo a dependência de fornecedores estrangeiros e promovendo a autossuficiência. Além disso, um compromisso sólido com o orçamento de defesa impulsiona a geração de empregos e a capacitação técnica, fortalecendo a economia e contribuindo para a soberania nacional. No entanto, esse é um desafio que requer planejamento estratégico e compromisso a longo prazo, pois a constante evolução das ameaças e das tecnologias demanda investimentos contínuos e adaptativos. Portanto, a continuidade dos investimentos em defesa é não apenas uma questão de segurança, mas uma estratégia fundamental para o crescimento sustentável da indústria de defesa nacional.
O fortalecimento da BID também requer um diálogo contínuo entre o governo, as empresas e a sociedade civil. A transparência nas relações e a promoção de um ambiente de negócios favorável são essenciais para garantir a sustentabilidade e a competitividade da indústria de defesa.
A regulamentação da indústria de defesa no Brasil é complexa e tem como objetivo proteger a soberania nacional, a integridade das tecnologias estratégicas e promover a participação de empresas brasileiras. As exigências de controle nacional e a limitação da transferência de tecnologia para o exterior são fundamentais para garantir que o Brasil desenvolva sua capacidade de defesa de forma autônoma e sustentável.
É crucial desmistificar mitos associados à participação estrangeira e à aquisição de empresas de defesa, enfatizando a importância de manter as tecnologias críticas sob controle nacional. A construção de um futuro seguro e próspero para a indústria de defesa brasileira depende da colaboração entre o governo, as empresas e a sociedade, bem como do compromisso contínuo com a pesquisa, inovação e desenvolvimento tecnológico. O Brasil tem o potencial de se tornar uma potência em defesa, e a regulamentação adequada é um passo vital nessa direção.
Por Angelo Nicolaci
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