quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

O que está por trás da aliança islâmica contra o EI?

Formação da coalizão com mais de 30 países reforça guerra por procuração entre Arábia Saudita e Irã na região. Situação, alertam especialistas, pode se agravar sobretudo para civis sírios.
Nos próximos meses, o céu sobre a Síria deverá registrar um tráfego aéreo ainda mais intenso do que o atual. Já há anos, o regime de Bashar al-Assad tem jogado bombas sobre a população civil. Mais tarde vieram os ataques aéreos da coalizão liderada pelos EUA contra a organização terrorista "Estado Islâmico" (EI).
Os russos então passaram a bombardear diferentes alvos. E agora são os aviões da aliança militar liderada pela Arábia Saudita que vão sobrevoar o espaço aéreo sírio numa nova luta contra o terrorismo. Essa aliança é a maior de todas: são 34 países do Oriente Médio, Ásia e África.
"Atualmente, reina tal confusão no espaço aéreo sírio que ninguém consegue mais diferenciar quem ali está atirando em quem", descreve o especialista em Oriente Médio Michael Lüders.
O denso tráfego aéreo aumenta consideravelmente o potencial explosivo da situação, diz Lüders, alertando que uma possível colisão acidental entre dois aviões de combate poderia acirrar ainda mais as tensões.
A situação pode continuar a se agravar especialmente para os civis sírios, diz o analista político Ali Ibrahim em artigo no jornal Asharq al-Awsat. Segundo o articulista, isso também teria consequências para a Europa.
"Em busca de um lugar seguro, dezenas de milhares de sírios estão dispostos a atravessar o Mar Mediterrâneo. Isso mostra quão grande é o caos dessa situação. A fuga deles poderia levar a novos problemas e transtornos na UE", afirma.
Os motivos por trás da aliança árabe também são de natureza política. Da mesma forma, os voos da coalizão liderada pelos EUA foram, recentemente, alvo de críticas.
"As bombas ocidentais sobre o Iraque e a Síria vão fazer surgir tantos combatentes jihadistas quanto aqueles que vão destruir", escreve o especialista em Oriente Médio Serge Halimi no jornal Le Monde diplomatique. "Uma solução duradoura dependerá dos povos da região, não das antigas potências coloniais ou dos EUA."
Teoricamente, a nova aliança poderia, em primeiro lugar, reivindicar uma maior legitimidade, já que reúne toda uma série de países anteriormente colonizados. Países que pertenciam à federação de territórios da África Ocidental Francesa – como Benin, Costa do Marfim e Mali – defendem que na Síria devem intervir não somente os tão criticados Estados ocidentais, mas também países que antes estavam sob o seu domínio. E os Estados muçulmanos da nova coalizão poderiam desacreditar a propaganda do EI de que, na Síria e no Iraque, estaria acontecendo uma "cruzada" contra o islã.
Em breve, aviões de combate sauditas também poderão ser vistos nos céus da Síria

Liderança controversa

Problemática, porém, é a liderança da nova aliança militar: Arábia Saudita. O país empreende já há nove meses uma guerra no Iêmen, que segundo dados das Nações Unidas já matou 6 mil pessoas e feriu 30 mil. Atualmente, o país no sul da Península Arábica registra 2,3 milhões de deslocados internos.
O especialista em Oriente Médio Michael Lüders aponta que, acima de tudo, a Arábia Saudita seria um adversário do EI altamente questionável devido à sua própria ideologia altamente conservadora: "A Arábia Saudita é um país com uma ordem político-religiosa, que não se diferencia muito do sistema do 'Estado Islâmico'. Neste ano, morreram mais pessoas executadas pela espada na Arábia Saudita do que decapitadas pelos jihadistas do EI. Nesse sentido, a guarda das ovelhas é entregue ao lobo."
A própria Arábia Saudita está sendo há muito tempo ameaçada pelo EI. A partir do vizinho Iraque, o grupo terrorista já tentou várias vezes romper a fronteira para o reino saudita. Também no Iêmen o "Estado Islâmico" já fincou pé.
Desde que Saddam Hussein invadiu o Kuwait em 1990, e os EUA, posteriormente, passaram a estacionar tropas na Arábia Saudita, muitos islamistas não se deixam mais impressionar pelo wahabistas, seguidores da vertente do islã predominante no Estado saudita. Pelo contrário: os wahabistas são vistos por eles como colaboradores de um regime corrupto.
Analista Ali Ibrahim: "Dezenas de milhares de sírios estão dispostos a atravessar o Mediterrâneo"

Rival Irã

De acordo com a revista online Al-Monitor, que se ocupa da política do Oriente Médio, frente ao atual governo saudita, o EI se apresenta como um movimento incorruptível. Além disso, diz a publicação, ele também representa um velho sonho do islamismo político: o restabelecimento do califado, abolido por Mustafa Atatürk, fundador da República da Turquia, em 1924. Isso faz aumentar a atratividade do movimento jihadista em muitos lugares, explica Al-Monitor.
Além disso, há a amargura de muitos muçulmanos sobre os regimes autoritários na região. "Esta amargura foi herdada pela geração mais jovem, que quer pertencer a uma organização que consiga unir poder, religião e modernidade. E é isso que lhes proporciona o EI", diz a revista online.
A nova coalizão poderá reforçar não só as tensões do lado sunita, mas também piorar ainda mais as relações já abaladas da Arábia Saudita com os xiitas, principalmente com o Irã.
Por meio da nova aliança militar, diz Michael Lüders, a guerra por procuração entre esses dois Estados na Síria se agrava ainda mais. Isso é ainda mais verdadeiro pelo fato de, para a Arábia Saudita, o que importa é, em última instância, combater o "Estado Islâmico", mas também a luta de poder com o Irã: "O objetivo é limitar a influência de Teerã", conclui Lüders.

Fonte: Deutsche Welle
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