terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Carta de Temer acirra crise política, Dilma ainda terá outra batalha...

O vice-presidente Michel Temer enviou nesta segunda-feira (07/12) uma carta a presidente Dilma Rousseff se queixando da "desconfiança" da mandatária quanto a sua pessoa e ao seu partido, o PMDB, parceiro do PT na coalizão governista.
O texto tem potencial para acirrar a crise política e reflete as divisões que Dilma enfrenta dentro da própria base aliada, o que pode dificultar sua sobrevivência ao processo de impeachment. Na "carta pessoal", que acabou divulgada pela imprensa, o vice-presidente se queixa de seu papel meramente "decorativo" e "secundário" durante o primeiro mandato de Dilma.
"Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas", diz Temer. "Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários."
Temer diz que sempre foi leal à presidente, que lutou para manter a unidade de seu partido e o apoio ao governo, e acusa o governo de tentar dividir o PMDB. "Sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção", afirma ao final da carta.
O documento foi divulgado às vésperas da escolha da comissão especial que vai analisar um possível processo de impeachment contra a presidente, marcada para esta terça-feira pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
A comissão, com 65 membros, vai determinar se o pedido de destituição da presidente será julgado pelo órgão legislativo através de votação em plenário, ou se será arquivado.
Caso o impeachment de Dilma seja aprovado no Congresso, Temer deverá assumir a presidência até as eleições presidenciais de 2018.

Abaixo, a íntegra da carta de Temer:

São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora Presidente,
"Verba volant, scripta manent" (As palavras voam, os escritos permanecem)
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos.
Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.
Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1. Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2. Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.
3. A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.
4. No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas "desfeitas", culminando com o que o governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta "conspiração".
5. Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.
6. De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.
7. Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.
8. Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden - com quem construí boa amizade - sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da "espionagem" americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança;
9. Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma conexão com o teor da conversa.
10. Até o programa "Uma Ponte para o Futuro", aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.
11. PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silêncio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.

A outra batalha de Dilma

Enquanto o processo de impeachment começa a ser desenhado na Câmara dos Deputados, a presidente Dilma Rousseff também terá que se preparar para defender o seu mandato em outra frente: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na última sexta-feira (04/12), o tribunal publicou o acórdão proferido pelo ministro Gilmar Mendes que decidiu pela continuidade de uma Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime). A ação foi proposta pelo PSDB para pedir a cassação do mandato de Dilma e de seu vice, Michel Temer (PMDB). O efeito prático da publicação é dar início ao prazo para que a presidente apresente sua defesa – a previsão é de sete dias úteis a partir da notificação.
O PSDB acusa a chapa de Dilma de abuso de poder econômico e fraude no pleito, apontando, entre outras suspeitas, que dinheiro desviado da Petrobras ajudou a financiar a campanha da presidente. Além da Aime, outras duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) e uma representação contra Dilma também tramitam no TSE.
O presidente do TSE, Dias Toffoli, ainda não definiu se as ações vão tramitar em conjunto. Segundo Toffoli, caberá ao plenário do TSE decidir, mas somente após a apresentação de defesa da presidente e do vice. Na prática, todas as ações podem resultar na cassação de Dilma e Temer.
Os tucanos pedem ainda que, caso a chapa da presidente seja condenada em algum dos processos, a chapa do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e de seu vice, Aloysio Nunes (PSDB-SP), assuma a Presidência. Nesse cenário, caberá ao TSE decidir se é o caso de a oposição assumir ou se serão realizadas novas eleições.

O TSE havia inicialmente arquivado a Aime, mas em 6 de outubro, após o PSDB recorrer, decidiu aceitá-la. Foi a primeira vez na história do tribunal que uma ação desse tipo contra um presidente eleito foi aceita.
Enquanto o início do processo de impeachment concentrou as atenções na semana passada, a publicação do acórdão do TSE, quase dois meses depois da decisão do tribunal, ainda não provocou nenhuma tempestade política.

Ação inédita

Segundo o especialista em direito eleitoral João Fernando Lopes de Carvalho, as ações que correm no TSE não devem ser subestimadas. "Essa tramitação no TSE tem que ser levada a sério. É algo inédito. Esse tipo de ação é relativamente comum quando se trata de mandatos que envolvam governadores, prefeitos e parlamentares, mas no caso de um presidente, nunca algo do tipo havia avançado tanto", afirma.
De acordo com Lopes, ainda é cedo para especular sobre a possibilidade de a Aime ou outras ações prosperarem. Mesmo com o prazo de apresentação da defesa, tal como o impeachment, qualquer decisão sobre a cassação pelo tribunal deve ficar para 2016. Somente a partir de fevereiro, quando a Justiça voltar do recesso, é que a ação deve voltar a andar.
"O processo ainda não iniciou a fase de coleta de provas, de oitivas, etc. E, mesmo que apareçam indícios de fraude, os ministros vão ter que avaliar a proporcionalidade dos crimes. Não basta que dinheiro irregular tenha alimentando a campanha, é preciso provar de que esses crimes influenciaram decisivamente no resultado eleitoral. Caso isso seja comprovado, a chapa poderá ser cassada e serão convocadas novas eleições", afirma.
Ainda de acordo com Carvalho, mesmo que o processo ainda demore a chegar a uma fase decisiva, a presidente deve enfrentar dificuldades no tribunal, caso apareçam indícios contra ela.
"O rito do TSE é puramente jurídico. Enquanto no processo de impeachment do Congresso os métodos são, digamos, mais políticos, o TSE se guia por critérios puramente jurídicos. Se espera mais imparcialidade e que seja mais difícil de influir no processo. A qualidade da defesa vai desempenhar um papel mais importante do que acordos e alianças políticas", afirma Lopes.
Essa natureza "técnica" do TSE tem sido vista como uma opção por alguns políticos da oposição, que não querem se associar ao processo de impeachment na Câmara, iniciado pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Suas motivações estão sendo interpretadas como uma vingança pessoal contra o Planalto.
No último fim de semana, a ex-senadora Marina Silva, fundadora da Rede Sustentabilidade, afirmou que não vê indícios suficientes para um impeachment, mas orientou o seu partido a reforçar o apoio às ações no TSE.
"Temos que apoiar as investigações para não ter nenhum pacto para livrar a cara de quem quer que seja", afirmou. "O processo do TSE abarcará as denúncias dos dois lados (PT e PMDB). O problema é que a investigação no Congresso é marcada o tempo todo pela barganha", disse Marina ao jornalValor.
A posição também foi partilhada pelo coordenador nacional da Rede, Pedro Ivo Batista. "O caminho da Justiça é mais isento que este caminho que está no Congresso, marcado por acusações de chantagem", disse.

Fonte: Deutsche Welle

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