A geopolítica mundial está entrando em uma nova era de disputas estratégicas. Se no século XX a Guerra Fria foi marcada pela corrida armamentista, pela ameaça nuclear e pelo equilíbrio de poder entre blocos militares, hoje a rivalidade entre potências assume outra dimensão. A corrida não se dá apenas pela quantidade de tanques, submarinos ou ogivas, mas pela capacidade de controlar tecnologias de ponta que moldam não apenas a guerra, mas também a economia global. O tabuleiro central dessa disputa é formado pelos chips semicondutores, pelos sistemas de drones e pela inteligência artificial, elementos que juntos estão redefinindo o que significa ter poder no século XXI.
Os chips em particular, são o coração invisível de praticamente toda a infraestrutura moderna de defesa. Sem eles não há radares, satélites, comunicações seguras, sistemas de navegação ou armamentos inteligentes. A maior parte da produção global de semicondutores avançados está concentrada em Taiwan, transformando a ilha em ponto de tensão estratégica entre China e Estados Unidos. Washington busca limitar o acesso chinês a tecnologias de ponta por meio de sanções, ao mesmo tempo em que reforça a importância da TSMC, maior fabricante mundial de semicondutores, para o equilíbrio global. Pequim, por sua vez, investe pesadamente para desenvolver sua própria capacidade produtiva, ciente de que a dependência externa é um risco inaceitável em tempos de rivalidade crescente. Assim como no passado se falava em “petróleo como motor da geopolítica”, hoje os semicondutores ocupam esse lugar central, funcionando como combustível essencial para a soberania tecnológica e militar.
Paralelamente, a guerra da Ucrânia revelou o impacto de outra revolução: a dos drones. O que antes era visto como ferramenta auxiliar de vigilância rapidamente se transformou em uma arma estratégica de baixo custo e alto impacto. Pequenos drones, muitas vezes comerciais adaptados com explosivos improvisados, passaram a destruir blindados, posições de artilharia e até infraestruturas críticas, demonstrando que sistemas de milhões de dólares podem ser neutralizados por equipamentos que custam algumas centenas. Essa assimetria alterou a lógica do campo de batalha e inspirou novos conceitos, como o uso de enxames autônomos capazes de saturar defesas aéreas de forma massiva. No Oriente Médio, drones iranianos já são utilizados em larga escala, mudando o equilíbrio de forças regionais e obrigando potências ocidentais a adaptarem suas doutrinas defensivas. A lição é clara: no futuro próximo, nenhuma força armada poderá ignorar a ameaça ou o potencial transformador dessas plataformas.
A terceira peça desse novo xadrez estratégico é a inteligência artificial. A IA deixou de ser uma promessa futurista para se tornar presença concreta em diversos sistemas militares. Hoje, algoritmos são utilizados para interpretar imagens de satélite, prever deslocamentos inimigos e apoiar a tomada de decisões em tempo real. Os Estados Unidos trabalham intensamente no conceito de “manned-unmanned teaming”, em que aeronaves tripuladas comandam de forma integrada enxames de drones, ampliando exponencialmente a capacidade de combate. Rússia e China também exploram a IA, mas com um enfoque adicional em guerra eletrônica, apostando na possibilidade de confundir e paralisar os sistemas adversários em vez de apenas competir em capacidade de processamento. O resultado é um ambiente onde a linha entre homem e máquina se torna cada vez mais difusa, e onde decisões críticas podem ser tomadas por sistemas autônomos em velocidade impossível de ser acompanhada por comandantes humanos.
Para o Brasil, essa nova Guerra Fria tecnológica apresenta riscos e oportunidades. Nossa dependência externa em semicondutores, sensores e sistemas críticos expõe vulnerabilidades estratégicas: em caso de bloqueios ou sanções internacionais, setores fundamentais da defesa e da economia poderiam ser paralisados. Ao mesmo tempo, o país já dá sinais de buscar autonomia em áreas-chave, como no Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE), voltado para garantir comunicações seguras via satélite, e nos projetos da BID, que investe no desenvolvimento de aeronaves remotamente pilotadas. No entanto, essas iniciativas ainda não compõem uma política nacional robusta capaz de enfrentar o desafio estrutural imposto por esse novo cenário global. A ausência de uma estratégia consistente para semicondutores e inteligência artificial aplicada à defesa pode comprometer a soberania em um futuro próximo.
A lição que se impõe é que a guerra do século XXI não será vencida apenas com soldados em terra, navios no mar ou caças no ar. O verdadeiro campo de batalha se estende ao domínio invisível dos dados, dos algoritmos e dos microprocessadores. O país que dominar a tríade composta por chips, drones e inteligência artificial terá não apenas superioridade militar, mas também capacidade de influenciar o rumo da economia mundial e das relações internacionais. O Brasil, ao decidir seu caminho, deve compreender que investir em tecnologia de ponta não é apenas uma questão de modernização, mas de soberania e sobrevivência estratégica em um mundo cada vez mais competitivo e incerto.
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