O presidente Donald Trump autorizou o envio de 300 soldados da Guarda Nacional para Chicago, citando o que descreveu como um “crime fora de controle” na cidade. A decisão foi anunciada poucas horas depois de autoridades federais de imigração relatarem confrontos com manifestantes, que resultaram em um tiroteio envolvendo uma mulher armada após uma perseguição de veículos na cidade.
De acordo com comunicado do Departamento de Segurança Interna (DHS), a mulher teria disparado contra agentes da Patrulha de Fronteira e acabou sendo baleada. Ela foi levada a um hospital local, mas as autoridades não divulgaram detalhes sobre seu estado de saúde.
Críticas e resistência política
A mobilização recebeu forte oposição de autoridades estaduais e locais. O governador de Illinois, JB Pritzker, acusou Trump de “fabricar uma crise” e usar o poder federal de forma abusiva. Segundo Pritzker, “a situação em Chicago está sob controle, e qualquer ação militar sem consentimento estadual é uma violação da soberania de Illinois”.
A decisão também ocorre em meio a uma disputa judicial em Portland, Oregon, onde uma juíza federal, Karin Immergut, bloqueou temporariamente o envio de 200 soldados federais, classificando as declarações do presidente sobre a cidade como “desvinculadas dos fatos” e alertando para o risco de “confundir os limites entre poder civil e militar, em detrimento da Constituição”.
Immergut ressaltou que o uso de tropas federais sem o consentimento do governo estadual “coloca em risco a soberania dos estados e alimenta tensões locais”. O precedente legal em Portland pode influenciar possíveis contestações judiciais em Illinois, caso as tropas realmente sejam mobilizadas.
Cenário de tensão em Chicago
Chicago tem sido palco de protestos contra a política migratória federal, especialmente nas proximidades das instalações do Serviço de Imigração e Alfândega (ICE). Os atos, que começaram pacíficos, degeneraram em alguns episódios de confronto com agentes federais.
Trump vem ameaçando enviar forças federais e tropas da Guarda Nacional à cidade há quase um mês, citando índices de criminalidade e tiroteios. Contudo, dados oficiais do Conselho de Justiça Criminal indicam que a taxa de homicídios caiu cerca de 33% no primeiro semestre em comparação com o mesmo período do ano anterior. Apesar da queda, os níveis de violência permanecem elevados em relação à média nacional.
No último feriado do Dia do Trabalho, pelo menos 58 pessoas foram baleadas, oito delas fatalmente, números que reforçam o desafio persistente da segurança pública local.
Contexto constitucional e precedentes da Guarda Nacional
A decisão reacende o debate sobre os limites constitucionais do uso da Guarda Nacional em território norte-americano. Pela legislação, as forças da Guarda são geridas primariamente pelos governadores estaduais, e sua mobilização federal direta é restrita por leis como o Posse Comitatus Act (1878), que limita o emprego de militares em funções de policiamento interno.
Entretanto, em situações de emergência ou agitação civil, o governo federal pode recorrer à Insurrection Act (Lei da Insurreição) — legislação que permite o uso das forças armadas para restaurar a ordem quando as autoridades estaduais não conseguem fazê-lo.
Nos últimos 70 anos, a Guarda Nacional foi acionada em diversos momentos emblemáticos:
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1967 – Detroit: o presidente Lyndon B. Johnson enviou 5.000 guardas nacionais e tropas federais para conter distúrbios raciais que deixaram 43 mortos.
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1992 – Los Angeles: após o veredito do caso Rodney King, a Guarda Nacional foi mobilizada para conter tumultos que resultaram em mais de 60 mortes.
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2020 – Protestos do movimento Black Lives Matter: durante o governo Trump, a Guarda Nacional foi usada em Washington D.C. e em várias capitais estaduais, inclusive Portland, para conter manifestações contra a violência policial.
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2021 – Ataque ao Capitólio: mais de 25 mil guardas nacionais foram deslocados a Washington para reforçar a segurança após a invasão ao Congresso.
Esses episódios demonstram que o envio da Guarda Nacional costuma ocorrer sob circunstâncias excepcionais e em coordenação com autoridades locais. O atual impasse em Chicago reacende discussões sobre a autonomia dos estados e o uso político das forças federais, um tema que permanece sensível na história institucional dos Estados Unidos.
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