quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Análise: O declínio russo e a ascensão de China e Türkiye no mercado global de defesa

A recente Conferência de Segurança Internacional de Moscou trouxe à tona uma acusação contundente: Igor Kostyukov, chefe da Diretoria Principal de Inteligência do Ministério da Defesa da Rússia, afirmou que os Estados Unidos estariam conduzindo uma campanha de “chantagem” contra países da Ásia-Pacífico, visando sabotar exportações russas de armas por meio de sanções e pressões políticas. Essa declaração, além de polêmica, reflete um fenômeno mais profundo: a gradual erosão da presença da Rússia no mercado global de defesa, historicamente dominado por Moscou em várias regiões.

O exemplo mais significativo é a Índia, que embora tenha adquirido o sistema de defesa S-400, demonstra cautela em futuras aquisições de equipamentos russos, como o caça Su-57. A pressão americana se faz sentir de maneira direta, incluindo tarifas e advertências políticas. Casos semelhantes ocorreram na Indonésia e nas Filipinas, onde contratos para aeronaves Su-35 e helicópteros Mi-171 foram cancelados ou substituídos por alternativas ocidentais, como F-15EX, Rafale e CH-47 Chinook, demonstrando um efeito dominó no Sudeste Asiático.

O Irã é outro exemplo de país tradicionalmente dependente de equipamentos russos que agora busca diversificação em direção à China. Pressionado por sanções ocidentais e diante da limitação de fornecimentos russos, Teerã tem intensificado negociações para aquisição de sistemas de defesa aérea, mísseis balísticos e tecnologias de vigilância chinesas. Essa mudança reflete uma estratégia pragmática de reduzir vulnerabilidades logísticas e políticas, ao mesmo tempo em que aproveita o crescimento da indústria militar chinesa, capaz de oferecer soluções modernas e customizáveis, com menor risco de interrupções no fornecimento.

Além das pressões externas, a própria capacidade industrial russa está comprometida pela guerra na Ucrânia. Relatórios do SIPRI apontam que as exportações russas caíram 53% entre 2019 e 2023, com um colapso ainda mais acentuado após 2021, totalizando menos de US$ 1 bilhão em 2024, uma retração de 92% em três anos. A combinação de sanções e limitações industriais abriu espaço para novos players globais.

É nesse contexto que se observa a ascensão de China e Türkiye. Pequim tem investido pesadamente em tecnologias militares avançadas, oferecendo soluções competitivas em mísseis, sistemas de defesa aérea e veículos blindados, muitas vezes a preços mais atraentes e com menos restrições políticas do que os fabricantes tradicionais. Países da Ásia e do Oriente Médio, buscando diversificação e autonomia estratégica, têm se mostrado receptivos a essas alternativas chinesas, reduzindo a dependência de Moscou e de fornecedores ocidentais.

A Türkiye também se destaca nesse cenário, expandindo sua presença global com produtos variados e competitivos. Além dos caças KAAN vendidos à Indonésia, a indústria turca oferece drones de ataque e vigilância, como o Bayraktar TB2, que já se tornou referência em conflitos recentes. Sistemas de defesa aérea, como o Hisar-O e o Hisar-A, e veículos blindados da família Otokar demonstram capacidade tecnológica avançada e soluções integradas para diferentes cenários. No setor naval, a Türkiye exporta corvetas, fragatas e lanchas de patrulha, com destaque para o projeto MILGEM, que combina transferência tecnológica e produção local. Essa diversificação mostra que a indústria turca consegue fornecer pacotes completos fortalecendo a confiança de clientes internacionais que buscam alternativas confiáveis à Rússia.

O resultado é uma reconfiguração estrutural do mercado global de defesa. A Rússia, cuja credibilidade já vinha abalada por atrasos e dificuldades logísticas, vê sua participação diminuída, enquanto China, Türkiye, Estados Unidos e países europeus expandem sua influência. Essa transformação não é apenas econômica; ela impacta a geopolítica regional, alterando alianças e dependências estratégicas em regiões críticas como o Sudeste Asiático, Oriente Médio e África.

Em síntese, o mercado global de defesa caminha para um cenário mais plural e competitivo. A capacidade de adaptação, inovação tecnológica e flexibilidade política será determinante para os fornecedores que desejam ocupar o vácuo deixado pela Rússia. China e Türkiye emergem como protagonistas nesse novo tabuleiro, consolidando-se como alternativas confiáveis e estratégicas para nações que buscam autonomia sem se vincular exclusivamente aos tradicionais fornecedores ocidentais.


por Angelo Nicolaci


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2 comentários:

  1. O maior culpado de tudo isso, e o próprio Putin, meteu a Rússia em uma guerra sem fome incapaz de vencer.

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  2. Não creio em pressão americana como fator determinante, MAS na necessidade de utilizar todo potencial de fabricação para o aumento quantitativo e qualitativo do excelente armamento russo. Eles estão em GUERRA contra 40 paises, e GANHANDO de lavada, destruindo as armas dos oponentes e , com ajuda da propria Europa, a desendustrializando.

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