quarta-feira, 12 de agosto de 2020

20 anos depois: A verdadeira história do desastre do submarino russo Kursk

20 anos atrás, em 12 de agosto de 2000, um exercício da frota naval se tornou uma corrida desesperada para recuperar sobreviventes dezenas de metros debaixo do mar.

Submarino nucear K-141 Kursk, da classe Antey (Oscar II para a OTAN)

Em 2000, um dos piores desastres acidentais com submarinos em tempos de paz de todos os tempos aconteceu na costa da Rússia. Uma enorme explosão afundou o gigantesco submarino Kursk de propulsão nuclear, matando quase toda sua tripulação e deixando quase duas dúzias de sobreviventes a dezenas de metros de profundidade. Uma operação internacional de resgate foi montada, mas não chegou a tempo de salvar os marinheiros.

O filme Kursk - a última missão, lançado em 2018, estrelando Colin Firth, conta a história do submarino. Neste artigo, contaremos o que realmente aconteceu.

 

Caçadores de Navios-Aeródromo


Uma das maiores preocupações da URSS durante a Guerra Fria era a frota americana de navios-aeródromo (NAe, "porta aviões"). Os soviéticos viam os NAe americanos tanto como plataformas capazes de lançar bombas termonucleares contra a "Mãe Rússia" e como caçador da frota soviética de mísseis balísticos. A URSS gastou vastas somas de dinheiro em sistemas de armas para caçar os NAe americanos em tempos de guerra.


Fotografia de 19/10/1999:  o oficial comandante do Kursk, Capitão de Primeira Classe Gennady Petrovich Lyachin, prestando continência depois de uma patrulha no Mediterrâneo

Uma destas soluções eram os submarinos da classe Antey. Conhecidos na OTAN pela designação “Oscar II”, eram uma casse de enormes submarinos de propulsão nuclear, desenhados para abater navios grandes – especialmente os NAe americanos. Os Oscar II tinham 154 m de comprimento, boca de 18,2 m e calado de 9 m, e deslocava 19.400 toneladas, o dobro de um destroier. Para conseguir acompanhar os NAe nucleares americanos, os submarinos soviéticos eram propulsados por dois reatores nucleares OK-650, com uma potência combinada de 98 mil cavalos-vapor. Tamanho poder lhes permitia alcançar 33 nós quando submersos.

Os Oscar II eram grandes porque precisavam carregar mísseis grandes. Cada submarino carregava 24 mísseis 3M45 P-700 Granit (OTAN: SS-N-19 Shipwreck); cada míssil tem o tamanho de um avião pequeno – 10 m de comprimento e peso de 7 toneladas. Têm uma velocidade máxima de Mach 1,6, alcance de 625 km e usavam o (agora aposentado) Legenda, um sistema de pontaria por satélite, cuja função principal era o ataque aos NAe. A ogiva do Granit podia ser de 750 kg de explosivos (o bastante para causar danos graves ao NAe) ou nuclear de 500 kiloton (o bastante para vaporizar um NAe).

 

Uma mulher ajusta uma coroa de flores num memorial do Kursk.

 

Treze submarinos Oscar I e II foram construídos, incluindo o K-141 – também conhecido como Kursk.

 

O torpedo que falhou


O Kursk foi completado em 1994 e designado para a Frota Russa do Norte. Em 12 de agosto de 2000, o Kursk fazia parte de um grande exercício da frota, juntamente com o NAe Almirante Kuznetsov e o cruzador de batalha Pyotr Velikiy. O Kursk estava com o armamento total, incluindo mísseis Granit e torpedos, e faria um ataque simulado ao Kuznetsov.

 

https://www.youtube.com/watch?v=2-qnUjrilng

 

Às 11:20 da manhã, hora local, uma explosão subaquática sacudiu a área do exercício, e dois minutos depois foi seguida por uma explosão ainda maior. Uma estação norueguesa de monitoramento sismológico registrou ambas as explosões. Um relato russo diz que o Pyotr Velikiy, de 28 mil toneladas, sacudiu com a explosão.

Dilacerado pelas explosões, o Kursk afundou, a 108 m de profundidade e num ângulo vertical de 20 graus. As explosões causaram um imenso buraco na proa, junto ao compartimento de torpedos. Um comitê de investigação da Marinha Russa concluiu que a explosão foi causada por um torpedo super pesado Tipo 65-76A. A explosão foi provavelmente causada por uma solda defeituosa, que falhou em conter o peróxido de hidrogênio da câmara de combustível.

 

A torre de comando do Kursk pode ser vista enquanto o submarino é rebocado de volta ao estaleiro de Roslyakovo, Rússia.

 

Como muitos torpedos antigos, os Tipo 65-76A usavam peróxido de hidrogênio como propelente. O perigo está no fato que este composto químico pode se tornar explosivo ao entrar em contato com substâncias orgânicas ou fogo.

De acordo com a NLM (Biblioteca Nacional de Medicina dos EUA), “Peróxido de hidrogênio, por si, não é inflamável, mas pode causar combustão espontânea de materiais inflamáveis e alimentar combustões pois ao se decompor libera oxigênio”. Um registro do NLM diz que “Um vazamento em tambores de peróxido de hidrogênio a 35% sobre um pallet de madeira causou ignição do mesmo. A combustão, embora numa área limitada, foi intensa e levou um bom tempo para extinguir. Um vazamento de tambores de peróxido de hidrogênio a 50% sobre pallets envoltos em polietileno entrou em ignição espontânea e gerou fogo intenso”.

 

Momentos decisivos

Então o que aconteceu a bordo do Kursk? A provável cadeia de eventos foi mais ou menos assim: Um vazamento de peróxido de hidrogênio causou um fogo, que por sua vez causou a explosão da ogiva de 557 kg do torpedo Tipo 65-76A. Esta foi a causa provável do rombo acima do compartimento de torpedos. A segunda explosão provavelmente foi causada pela detonação dos torpedos remanescentes no submarino.

 

O Tenente-Capitão Koselnikov, que escreveu uma carta duas horas depois do afundamento do Kursk, descrevendo que 23 marinheiros ainda estavam vivos. Nenhum deles viveu o bastante para ser resgatado.

 

O Kursk não matou todos os seus 118 tripulantes – não imediatamente, pelo menos. Um dos oficiais a bordo, Tenente-Capitão Dmitri Koselnikov, deixou uma carta, com horário de 2 horas após a segunda explosão, em que registra 23 sobreviventes. Apesar de um esforço de resgate montado às pressas, incluindo equipes da Inglaterra e da Noruega, o governo russo não conseguiu chegar aos sobreviventes a tempo. A carcaça do submarino foi recuperada em 2001 e retornado ao estaleiro de submarinos da Marinha Russa em Roslyakovo.


Originalmente publicado em: The True Story of the Russian Kursk Submarine Disaster, de Kyle Mizokami. Tradução e adaptação: Renato Marçal*


*Renato Henrique Marçal de Oliveira é químico e trabalha na Embrapa com pesquisas sobre gases de efeito estufa. Entusiasta e estudioso de assuntos militares desde os 10 anos de idade, escreve principalmente sobre armas leves, aviação militar e as IDF (Forças de Defesa de Israel).



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