segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

LIFT - Conheça as melhores opções para o Brasil

No dia 26 de agosto de 2019,, voou pela primeira vez na Suécia o novo caça da Força Aérea Brasileira (FAB), o JAS-39E Gripen, também conhecido por Gripen NG, o qual tem a designação F-39 Gripen na FAB. Pela primeira vez em décadas, a FAB terá em operação um vetor de primeira linha, o que é indiscutivelmente, uma grande conquista da valorosa Força.

Mas, como diz o ditado, “uma andorinha só não faz verão”, e o mesmo se aplica a qualquer sistema de armas, mesmo uma tão avançada como é o caso do Gripen E/F que representa um grande salto para a defesa brasileira. A FAB está ciente disto, e já se prepara para integrar o Gripen a outros elementos que amplificam sua efetividade e possibilitará o emprego pleno de suas capacidades e tecnologias, como nosso Embraer E-99 AEW&C (Alerta Aéreo Antecipado) e R-99 (sensoriamento remoto), nossas aeronaves de patrulha marítima P-3AM e os novos cargueiros/reabastecedores táticos KC-390, além de outros elementos que estão em processo de obtenção, como é o caso dos futuros “KCs”, os quais devem se basear na plataforma do Boeing 767, os quais deverão ser denominados KC-767, os quais terão por missão o REVO (Reabastecimento Estratégico) e Transporte de Pessoal e Carga. As capacidades do Gripen ganham maior amplitude através da sinergia com estes meios da FAB.

Entretanto, uma lacuna permanece em aberto nas capacidades de nossa Força Aérea, e até o momento não há no horizonte qualquer sinal de uma resposta a esse vácuo existente com a ausência de uma aeronave para desempenhar o papel de  LIFT (aeronave para treinamento e caça leve). Depois da desativação dos saudosos Xavantes em 2013, o meio mais avançado que a FAB dispõe no campo de qualificação e preparo de seus pilotos é o AT-29 “Super Tucano”, que embora seja uma excelente aeronave de treinamento e ataque leve, é incapaz de simular fielmente as amplas capacidades de caças modernos como é o caso de nossos Gripen E/F, dentre outros aspectos por não possuir o mesmo desempenho proporcionado por uma aeronave a jato.

O mercado internacional possui várias opções que atendem a esta necessidade, onde encontramos algumas aeronaves muito interessantes para desempenhar  papel de LIFT. Neste artigo vamos falar sobre algumas delas, levando em conta estritamente os critérios técnicos, considerando aeronaves que ainda estejam em produção e não sejam consideradas obsoletas ou defasadas tecnologicamente, como é o caso dos MB-339, que ficarão de fora da lista, bem como treinadores turboélice, os quais não se enquadram no perfil que analisamos aqui como uma hipotética opção para cobrir a lacuna existente na FAB. Como de costume, uma tabela com a ficha técnica comparativa de cada aeronave constará ao final do artigo.

Como exceção à regra, não serão incluídos de modelos que não são fornecedores tradicionais para o mercado ocidental, apresentando características logísticas que dificultam sua disponibilidade operativa, como é o caso de algumas aeronaves de origem Chinesa, ou mesmo os tipos Russos, os quais apesar das qualidades e boa impressão obtida com os AH-2 “Sabre”, são encarados como pouco prováveis de ser operados em território brasileiro, nos focando em plataformas cuja probabilidade de aquisição pela FAB é aceitável.

A título de comparação, o Embraer EMB-326 “Xavante” tinha as seguintes características:

  • Monomotor
  • Subsônico
  • Sem fly-by-wire
  • Sem radar, data link ou previsão para armas e sistemas avançados
  • Sem canhão interno




Leonardo M-346 Master

O M-346 Master é um  treinador avançado, o qual surgiu nos idos de 1993, fruto de uma cooperação entre a Rússia e a Itália,  qual desenvolvia o YAK-130, aeronave de treinamento avançado que tinha por objetivo substituir os MB-339 italianos e os Aero L-39 russos, a nova aeronave binacional ganhou os céus em 1996, porém, diferenças  entre as partes levaram a saída dos italianos do programa no ano 2000, os quais optaram pelo desenvolvimento da variante italiana desta plataforma, dando origem ao M-346, o qual tinha por alvo o mercado ocidental, enquanto a variante russa, YAK-130, tinha por foco os tradicionais clientes de Moscou.

O primeiro M-346 voou em 15 de julho de 2004, o qual apresentava inúmeros avanços e capacidades superiores ao seu antecessor (MB-339),o bimotor italiano possui um desempenho formidável, podendo atingir a velocidade de 1.255 Km/h (Mach 1.15), sendo adotada pela Força Aérea Italiana, que opera 18 aeronaves do tipo como seu treinador avançado, o qual também foi adotado por Israel, que opera 30 aeronaves, as quais foram objeto de uma negociação envolvendo uma troca de aeronaves e satélites entre os dois países, sendo denominado M-346 “Lavi”, sendo operados também na Polônia e Cingapura.

O M-346 resultou em outras variantes, as quais incorporam capacidades multifunção, sendo capazes de realizar tanto missões de treinamento avançado, como também missões de combate, o caso das variante M-346 LCA (Light Combat Aircraft) desenvolvida em 2015 mirando o programa de substituição da frota de Su-22 da Polônia, a variante M-346 FT (Fighter Training) capaz de alternar entre missões de treinamento e combate, a qual incorporou novos recursos que incluem um novo sistema tático de dados e capacidade de armamento diferente da variante LCA, porém, não incorporaram mudanças em sua estrutura, e por último temos a variante M-346 FA (Fighter Attack), desenvolvida em 2017, capaz de cumprir com missões de combate nos cenários ar-ar e ar-superfície com uma carga útil de 2 toneladas distribuída por 7 estações de armas , incorporando um avançado radar Grifo-346, sistemas de  contra-medidas e recursos furtivos, incluindo grades na admissão dos motores e revestimentos de absorção radar em pontos críticos da fuselagem. Está variante tem como alvo forças que possuem um orçamento restrito, oferecendo uma solução capaz de prover treinamento avançado e capacidades de combate.

Inclusive durante a LAAD 2019, o GBN Defense apurou que a Leonardo ofertou o M-346 à FAB, apontado como uma solução adequada para substituição das aeronaves de ataque A-1 em serviço com a FAB, apresentando um envelope de missão que permitiria à FAB cobrir sua necessidade de treinamento para os futuros pilotos de F-39 Gripen E/F, como plataforma de treinamento avançado que cobriria a lacuna entre o A-29 e o F-39, somando a sua capacidade de prover treinamento avançado, a capacidade de executar todas as missões hoje incumbidas ao A-1, sendo um verdadeiro LIFT. Lembrando que o Gruppo Leonardo possui um longo histórico de cooperação com as Forças Armadas brasileiras, atuando em diversos setores da indústria de defesa, particularmente na aviação, parcerias com os italianos resultaram no EMB-326 Xavante e AMX A-1. 


Boeing / Saab T-7A Red Hawk

A USAF opera como treinador desde 1961, o T-38 Talon, antecessor do nosso F-5. Porém, no ano de  2003 deram início a estudos para substituí-lo, e em 2015 o programa T-X foi oficialmente lançado, o qual atraiu diversos fabricantes do mundo inteiro que se uniram a indústrias norte americanas para oferecer um novo treinador avançado. Nesta disputa se sagrou vencedora a proposta da joint Boeing/Saab que ofereceu o T-7A Red Hawk, aeronave que voou pela primeira vez em 2016 e espera-se que entre em serviço já em 2023.

O T-7 incorpora as mais avançadas tecnologias de produção, o que o torna bastante fácil e barato de operar e manter. Servirá para formar os futuros pilotos da USAF por várias décadas, sendo a plataforma que irá preparar os futuros operadores do F-35, sendo apontado como um dos melhores treinadores no mercado.

O fato de ser feito pela própria fabricante do Gripen ajudaria muito na sua integração com o nosso F-39. Até o momento não há previsão para uma versão armada, o que pode complicar suas chances na FAB. Outro ponto que pode complicar as coisas pro T-7 é o fato de ainda estar em desenvolvimento, o que, por sua vez, também poderia abrir a remota possibilidade de participarmos do projeto, assim como foi com o próprio F-39. Vale lembrar, também, que programas militares levam bastante tempo, então a menos que a FAB faça um processo “sumário”, o T-7 pode muito bem ser um candidato viável até lá.


KAI T-50/TA-50/FA-50 Golden Eagle



A Força Aérea da Coreia do Sul (ROKAF) lançou em 1992, um programa destinado a criar uma aeronave nacional supersônica, visando substituir seus antigos A-37 e T-38 nas funções de ataque leve e treinamento avançado, para realizar a conversão de seus pilotos para os F-15 e F-16. Após anos de cancelamentos, relançamentos e estudos, o primeiro voo do T-50 ocorreu em 2002. A Lockheed Martin colaborou no desenvolvimento da aeronave, que tem vários elementos comuns ao F-16.

Há muitas versões do T-50, do “básico” T-50 ao mais completo FA-50, uma aeronave de ataque leve com excelentes capacidades, incluindo radar EL/M-2032, data link e possibilidade de montar pods de ECM (contra-medidas eletrônicas), LDP Litening e até foram propostas integrações de armas como o MBDA Meteor, que também está previsto para nosso F-39. De todas opções aqui apresentadas, é a única que pode utilizar um canhão interno, no caso uma versão derivada do M61 Vulcan, o A50, de 3 canos, calibre 20mm.

L-39NG
Aero L-39 NG e L-159 ALCA

A República Tcheca não é muito conhecida como fabricante de armas. Entretanto, a Aero Vodochody faz excelentes treinadores a jato desde a década de 1950. O L-39 Albatros, que voou pela primeira vez em 1968, foi uma das principais aeronaves de treinamento dos países do Pacto de Varsóvia durante a Guerra Fria, e foi exportado para muitos países. O L-39NG é praticamente uma aeronave nova, embora incorpore muito do L-39.

Questões políticas à parte, o L-39NG é uma aeronave avançada e de custos baixos, o que a tornaria uma ótima opção para a FAB, se bem que a idade do projeto original dificulte futuros upgrades, mas aí nos cabe apontar outra opção da República Tcheca, o L-159, “descendente” do L-39, sendo o treinador avançado que forma os pilotos dos Gripen daquele país.

L-159 ALCA
O L-159 é uma excelente opção de LIFT, o qual pode incorporar uma variante do radar Grifo que equipa nossos F-5EM, capaz de levar uma ampla carga de armas em até 7 estações de armas, sendo inclusive compatível com o LDP (pod de designação de alvos a laser) Litening, o mesmo que será empregado pelo F-39. Porém, esta aeronave não tem data link e é subsônico.

Um ponto que nos leva a não desconsiderar a aeronave como uma opção plausível, é o fato da República Tcheca ser uma das parceiras no programa Embraer KC-390, envolvendo possibilidades que a aquisição de aeronaves da KC-390 da Embraer, de alguma forma resultem em negociações sobre o L-39NG ou o L-159.




BAE Systems Hawk T2 AJT


O T2 é a última versão do onipresente Hawk, fabricado pela Hawker Siddeley, voou pela primeira vez em 1974. Apesar da idade do projeto original, o Hawk T2 é bastante moderno e inclui diversas melhorias, algumas das quais estavam presentes em versões avançadas de países como Arábia Saudita e África do Sul, a ponto de ser a aeronave que treinará os pilotos britânicos de F-35.

Tanto na África do Sul como na Tailândia, os Hawk são empregados como treinador pelos pilotos dos Gripen C/D destes países. Um derivado do Hawk, o T-45 Goshawk, é o LIFT padrão da US Navy. O Hawk possui versões avançadas que atuam como um dos meios principais de nações como a Malásia (Hawk 208). O hawk já foi usado em combate por vários países, registrando bons resultados.

O Hawk também é subsônico, e apresenta boas capacidades de armas; não conta com radar interno, mas pode incorporar um sistema de radar instalado em pod, além de contar com um avançado data link para troca de dados, capaz de usar dados obtidos por radares de outras aeronaves. Algumas versões do Hawk usam radares, então seria uma questão de opção.




Textron AirLand Scorpion

O Scorpion nasceu como uma iniciativa própria da Textron, realizando seu primeiro voo em 2013. Esta aeronave bimotor subsônica apresenta-se como um vetor avançado, capaz de realizar missões de treinamento avançado e ataque leve, mas que até o momento não foi adquirido por nenhum país, sendo um projeto ainda em desenvolvimento. Assim como o T-7, isso pode ser considerado uma vantagem ou uma desvantagem.

Além de poder carregar armas sob as asas e fuselagem, pode ser configurado conforme as necessidades do cliente, possibilitando, inclusive, que cumpra missões de reconhecimento.




CONCLUSÃO

Embora este artigo comente sobre as características técnicas, não podemos esquecer que questões políticas e econômicas podem sobrepujar as questões militares, e geralmente o fazem.

Lembrando que capacidades adicionais resultam em custos adicionais de aquisição e/ou operação, a FAB precisa responder algumas perguntas antes de escolher:

  • Um treinador desarmado ou com capacidades extras, como ataque leve e/ou reconhecimento?
  • Precisamos de aviônicos avançados, como o data link?
  • Precisamos da capacidade de transportar pods avançados como o Litening?
  • Subsônico ou supersônico?
  • Monomotor ou bimotor?
  • Canhão interno ou externo?
  • Com ou sem radar?
  • Já em operação em outros países, ou ainda em desenvolvimento?
  • Teremos a pretensão de fazer upgrades futuros ou não?

Estas e outras perguntas ajudarão a definir a aeronave que vai preparar os pilotos que terão sob seu comando o caça mais moderno da América Latina, e que por muitas décadas deverá preparar os pilotos que vão proteger os céus brasileiros voando o F-39 E/F. 

A tabela a seguir tem as especificações das aeronaves mencionadas no texto, e o Xavante para comparação; observe-se que estes dados são aproximados, pois dependem da configuração escolhida pelo cliente.






EMB326 Xavante
Aero L39NG
Aero L159
BAE Hawk T2
Boeing T-7
KAI FA50
Leonardo M-346
Textron Scorpion
Comprimento
m
10,7
12,1
12,7
12,4
14,2
13,1
11,5
13,9
Envergadura
10,9
9,6
9,6
9,9
10,0
9,5
9,7
14,6
Altura
3,7

4,9
4,0
4,0
4,8
4,8
4,1
MTOW¹
ton
4,6
5,8
8,0
9,1
5,5
12,3
9,5
9,9
Carga máxima
1,8
1,2
2,3
3,1
N/A
3,7
3,0
2,8
Hard points
un.
Até 6
Até 5
Até 7
Até 7
N/A
Até 7 + canhão
Até 9
Até 6 + paiol
Ferry²
km
1.665 (2.445³)
2.590
1.570
900 (2.520³)
1.840
1.851
1.981 (2.722³)
2.960 (4.100³)
Supersônico?

Não
Não
Não
Não
Sim
Sim
Sim
Não
Motor

Bristol Siddeley Viper 20
Williams International FJ44-4M
Honeywell / ITEC F124-GA-100
Rolls-Royce Turbomeca Adour Mk. 951
GE F404
GE
F404
Honeywell / ITEC F124-GA-200
Honeywell TFE731
Empuxo
lbf
3.410
3.800
6.300
6.500
11.000 sec/17.000 PC
11.930 sec/17.700 PC
12.600*
8.000*




¹ Peso máximo de decolagem, conforme recomendação do fabricante. Este valor depende de variáveis como altitude e temperatura do local de operação
² Alcance de travessia, ou seja, apenas ida, com combustível máximo; para atingir tal distância a aeronave geralmente não transporta nenhuma carga extra
³ Inclui combustível externo
* dois motores





Por: Renato Henrique Marçal de Oliveira - Químico, trabalha na Embrapa com pesquisas sobre gases de efeito estufa. Entusiasta e estudioso de assuntos militares desde os 10 anos de idade, escreve principalmente sobre armas leves, aviação militar e as IDF (Forças de Defesa de Israel), estreante no GBN Defense News.

Colaboração: Angelo Nicolaci - Editor/Jornalista, especialista em defesa e geopolítica.



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REFERÊNCIAS
http://www.koreaaero.com/english/ (abre melhor no Firefox)


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