
Alvo de espionagem estrangeira, a presidente Dilma Rousseff 
disse em um discurso na ONU que "o Brasil sabe proteger-se" de ameaças vindas 
pela rede. O sistema de defesa cibernética do país, no entanto, ainda dá os 
primeiros passos e está longe de garantir segurança contra ataques, apesar de o 
tema já figurar como prioridade na Estratégia Nacional de Defesa.
 
Entre as medidas discutidas pelo governo estão a criação de uma agência 
nacional de segurança cibernética e a implementação de ações integradas entre os 
muitos órgãos envolvidos na proteção da rede de computadores brasileira. 
Atualmente, a segurança das redes 
brasileiras não é centralizada. 
 
De acordo com o general José Carlos dos Santos, chefe do Centro de Defesa 
Cibernética do Exército brasileiro (CDCiber), um dos dois principais órgãos 
responsáveis por garantir a segurança das redes no país, o país precisa se 
preparar para a possibilidade de uma "guerra em rede".
Na tarde de domingo, a presidente Dilma Rousseff, anunciou ter determinando 
ao Serviço Federal de Processamento de Dados a implantação de "um sistema seguro 
de e-mail em todo o governo federal", nas palavras dela, publicadas no Twitter. 
"É preciso + segurança nas mensagens p/ prevenir possível espionagem", 
acrescentou.
Fragilidade
A fragilidade do sistema de segurança cibernético brasileiro foi escancarada 
em meio ao escândalo envolvendo o vazamento promovido por Edward Snowden, 
ex-colaborador da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA, na 
sigla em inglês). Documentos mostraram que a presidente foi alvo de espionagem, 
assim como o Ministério das Minas e Energia a a gigante Petrobras, com suspeitas 
de espionagem comercial nesse último caso.
Especialistas ouvidos pela BBC Brasil reforçam que "nenhum país está 100% 
protegido" da ação de hackers, sejam eles ativistas, integrantes de 
grupos criminosos ou funcionários de agências de inteligência de outros países. 
Todos também destacaram que o Brasil está dando passos importantes na 
construção de um sistema de defesa e segurança cibernética, embora esteja em um 
estado ainda inicial. Nenhum deles se disse surpreso pelos casos de espionagem 
revelados por Snowden.
 
A espionagem em si é sobretudo resultado de uma vulnerabilidade do sistema de 
segurança cibernética (que inclui a proteção de dados de instituições 
governamentais, privadas e de cidadãos em geral).
Há também o conceito de defesa cibernética, nos moldes militares. Redes de 
órgãos públicos e de empresas estratégicas podem ser vítimas - agora e, 
principalmente, no futuro - de ataques que se assemelham aos de uma campanha de 
guerra.
A fronteira entre segurança e defesa pode ser tênue. E as batalhas não são 
convencionais - travada na rede mundial de computadores, essa guerra silenciosa 
pode ter caráter destrutivo, mas os que estão no front geralmente não 
vestem o uniforme de um país, embora estejam a serviço de interesses de Estados 
nacionais. 
Estratégia de guerra
Em 2008, a Estratégia Nacional de Defesa recomendou o "fortalecimento de três 
setores de importância estratégica: o espacial, o cibernético e o nuclear".
Boa parte desta responsabilidade recai sobre o general José Carlos dos 
Santos, chefe do CDCiber, um dos dois principais órgãos responsáveis por 
garantir a segurança das redes no país.
"Baseados nas lições recentes, estamos plenamente conscientes de que isso é 
possível, uma guerra em rede", disse o general, em entrevista à BBC Brasil.
 
Entre as "lições" mencionadas pelo general estão os ataques virtuais a sites 
do governo, de bancos e jornais da Ucrânia, em 2007. Outro caso similar ocorreu 
durante a invasão russa à Geórgia, quando a ex-república soviética sofreu um 
"apagão" virtual. Nos dois episódios, pesaram suspeitas sobre Moscou.
Outro caso emblemático foi o ataque às instalações nucleares de Natanz, no 
Irã. O vírus autorreplicante Stuxnet destruiu várias centrífugas, retardando o 
programa nuclear do país, segundo a narrativa de especialistas da área. Israel 
foi apontado como provável responsável pelo ataque.
 
"Temos que estar preparados para essas eventualidades", diz o general. Ele 
conta que as academias militares já incluíram programas de tecnologia e 
segurança da informação em seus currículos.Em 2009, segundo o general, o 
ministério da Defesa teve aprovado um orçamento de R$ 400 milhões a ser 
executado em quatro anos, apenas com a segurança e defesa cibernética. Já as 
verbas destinadas a operações especiais durante a Copa do Mundo são de R$ 40 
milhões.
Vulnerabilidades
Para o professor Adriano Cansian, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) 
de São José do Rio Preto, o principal desafio do Brasil é se proteger contra os 
chamados "ataques de negativa de serviço".
Tais ataques ocorrem quando sistemas são bombardeados com falsos acessos, que 
acabam congestionando e derrubando sites.
Foi o que ocorreu em 2011, quando o site da Presidência e de vários 
ministérios e órgãos da administração federal foram alvo de ataques ao longo de 
vários dias. O braço brasileiro do movimento de hackers LulzSec assumiu 
a ofensiva que, segundo o grupo, tinha a intenção de mostrar a vulnerabilidade 
do sistema. 
 
Cansiam diz que as redes de determinados órgãos podem requerer atenção 
especial por serem estratégias em caso de guerra virtual.
"Considero a infraestrutura física mesmo. Em caso de conflito, emissoras de 
TV, rádio, centrais elétricas, ramificações de fibra ótica e data center de 
grandes empresas precisam ser protegidas", argumenta, apontando para alvos que 
também ficariam na linha de ataque em caso de guerras convencionais.
O pesquisador, que é consultor de segurança cibernética de órgãos 
governamentais, diz no entanto que "o maior problema é perder a conectividade da 
rede, por negativa de serviço".
"Como criamos dependência muito grande da rede, seja no comércio, no setor de 
serviços e entretenimento, se um ataque se prolongar, as consequências podem ser 
danosas. Imagina se por causa de um ataque a China ficar impossibilitada de 
fazer comércio com o mundo durante 20 dias… Isso vai ser sentido em todo lado", 
diz.
'A infraestrutura nacional de tecnologia de informação é ruim'
A segurança das redes brasileiras não responde a um comando 
único. Descentralizada em dois principais órgãos, com iniciativas e contribuição 
de vários ministérios, a estrutura é questionada por especialistas que defendem 
uma maior centralização, capaz de gerar respostas mais eficazes e evitar a 
sobreposição de tarefas.
A estratégia de defesa e boa parte das políticas gerais de segurança está a 
cargo do Centro de Defesa Cibernética do Exército (CDCiber), que responde ao 
Ministério da Defesa. Outro órgão importante é o Departamento de Segurança da 
Informação e Comunicações, do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência 
da República.
Segundo o relatório "A Segurança e a Defesa Cibernética do Brasil", publicado 
em julho pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, "a organização 
institucional tende a não favorecer ações integradas".
Além dos dois órgãos citados, parte da política de segurança e defesa é feita 
ou tem contribuição de instituições como a Agência Brasileira de Inteligência, a 
Polícia Federal e o Ministério de Ciência e Tecnologia.
"Apesar de algumas ações estarem em andamento, a infraestrutura nacional de 
tecnologia de informação é ruim", afirma o documento produzido pelo atual 
assessor de defesa da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel César da Cruz 
Júnior.
Articulação
Em entrevista à BBC Brasil, Cruz disse que "falta articulação 
institucionalizada" e que, hoje, boa parte dessa integração "depende de um 
relacionamento informal entre os órgãos".
"Como se fala em defesa cibernética sem envolver outros órgãos como 
Comunicações e Secretaria de Assuntos Estratégicos?", questiona.
Assim como Cruz, o general José Carlos dos Santos, diretor do CDCiber, 
destaca a importância de ações integradas. O tema já vinha sendo discutido em 
fóruns de especialistas, segundo ambos. Após o caso Snowden a discussão deve 
ganhar corpo.
A primeira iniciativa nessa direção foi a decisão que põe nas mãos do 
Gabinete de Segurança Institucional a edição de resoluções normativas para a 
área, a partir deste ano de 2013.
O general Santos diz ainda que "a ideia de uma agência nacional de segurança 
cibernética está sendo discutida". Cruz, por sua vez, propõe a instalação de uma 
escola nacional de segurança cibernética.
Mundo
A falta de uma estrutura clara de combate a ataques e crimes cibernéticos não 
é exclusividade brasileira. Cruz disse que "todo mundo está tentando se 
organizar internamente".
Cruz compara a estrutura brasileira a de outros países, como os Estados 
Unidos, onde todo esse arcabouço fica a cargo do Departamento de Defesa. O US 
Cyber Command cuida da política de defesa, enquanto a Agência Nacional de 
Segurança (NSA, na sigla em inglês) trabalha com a segurança das redes.
Segundo dados reunidos no relatório "A Segurança e a Defesa Cibernética do 
Brasil", o orçamento anual do US Cyber Command é de US$ 119 milhões (2012). O 
similar brasileiro, o CDCiber, teve no mesmo ano R$ 100 milhões, menos de 50% 
dos recursos do órgão americano, de acordo com o diretor do órgão, general José 
Carlos dos Santos.
O autor do relatório, Samuel César da Cruz Júnior, citou Japão, China e 
França como países com um sistema de segurança e defesa desenvolvidos, mas 
pontuou que sua avaliação é subjetiva, já que, por razões óbvias, faltam dados 
para uma comparação a contento.
"Mesmo os Estados Unidos são vulneráveis. Eles se autointitulam um país 
vulnerável, até porque sistemas computacionais não são 100% seguros e os 
americanos dependem muito deles", disse Cruz.
Segundo ele, "a China é superprotegida", mas há que se considerar "que o 
regime chinês é um caso à parte". "Não há internet na China, há uma grande 
intranet", diz, referindo-se ao isolamento chinês em relação à rede mundial de 
computadores.
 
 
Fonte: BBC Brasil