quarta-feira, 19 de abril de 2023

A guerra de Putin explodiu no norte da África

O Sudão rachou sob a influência de mercenários russos, e outras nações africanas podem seguir

Richard Kemp*

Com mais de 50 civis e muito mais militares já mortos na luta pelo poder entre facções governantes rivais que eclodiram no Sudão no fim de semana, não há lado bom nesta batalha. Mas, como em tantos outros conflitos na África e no Oriente Médio nos últimos anos, uma coisa que sabemos é que os encrenqueiros russos não estão longe da ação.

Os combates em Cartum e em outras partes do país foram desencadeados por confrontos entre o general Abdel Fattah al-Burhan, chefe das forças armadas sudanesas, e o general Mohamed Hamdan Dagalo, ou "Hemedti" para abreviar. Burhan e Hemedti deram um golpe em 2021, tomando o poder do

conselho de transição criado após a deposição do ditador islamista Omar al-Bashir. Hemedti é comandante das Forças de Apoio Rápido (RSF), um grupo paramilitar formado pelas milícias Janjaweed que ajudaram a conduzir, sob Bashir, o genocídio de Darfur, que se estima ter matado centenas de milhares de pessoas no oeste do Sudão.

Sem surpresa, o RSF foi vinculado ao Grupo Wagner de Yevgeny Prigozhin, que supostamente ajudou a treiná-los e equipá-los. Acredita-se que o Wagner tenha sido levado ao Sudão por Bashir para ajudar a fortalecer seu regime vacilante em 2017, após uma reunião com Putin na qual Bashir prometeu fazer do país a "chave para a África" para a Rússia. Entre seus planos estava uma base do Mar Vermelho para a marinha russa em Port Sudan, um projeto apoiado pelo Wagner.

Desde então, o Wagner forneceu grandes quantidades de armas e equipamentos ao Sudão, incluindo caminhões militares, veículos anfíbios e dois helicópteros de transporte. E, após a queda de Bashir, o grupo mercenário russo se realinhou com Burhan e especialmente com Hemedti. Continua a operar a empresa Meroe Gold, que supostamente explora as minas do Sudão e contrabandeia grandes quantidades de ouro para fora do país,

supostamente enchendo os bolsos de Prigozhin e negando receitas muito necessárias ao Sudão. Para Putin, isso ajudaria nos esforços para fugir das sanções ocidentais, permitindo-lhe alimentar sua guerra ilegal na Ucrânia.

Agora, o RSF, rico em dinheiro e fortemente armado, pode estar prestes a causar estragos na opinião pública na região norte-africana. O presidente do Egito, El-Sisi, vê um regime estável em Cartum como sendo do interesse vital de seu país. Ele olhará com desconfiança para a captura no sábado pelo RSF de tropas egípcias no Sudão para exercícios conjuntos, mesmo que Hemedti tenha garantido seu retorno seguro em algum momento no futuro. Também haverá grande alarme no Cairo sobre o impacto potencial dessa luta pelo poder no projeto da Grande Represa Renascentista Etíope, para o qual o apoio de Cartum é necessário para enfrentar os temores do Egito sobre o abastecimento de água através do Nilo.

Em última análise, esta é uma questão estratégica tão importante que, se o conflito sair do controle, o Egito pode sentir a necessidade de se afirmar com mais força, assim como a Etiópia.

Além disso, Chade, Eritreia e Sudão do Sul podem enfrentar um dilúvio de refugiados, aumentando suas próprias lutas internas, e um vácuo de poder permitirá que grupos extremistas em toda a região aproveitem o que está acontecendo.

Afinal, foi no Sudão que Osama bin Laden viveu por cinco anos, entre 1991 e 1996. Abrir vastas faixas do deserto para o próximo Bin Laden é algo que obviamente minou a segurança britânica e americana também.

Assim, Vladimir Putin, por acidente ou intencionalmente, ajudou a desencadear uma onda de violência que pode ter consequências desastrosas não apenas para o Sudão e o norte da África, mas para o mundo. Sua invasão fracassada da Ucrânia deu poder ao Grupo Wagner, que usa essa influência para saquear nações africanas e provocar problemas. Seu desespero por dinheiro desde que o Ocidente implementou severas sanções tornou necessário o apoio do Estado russo a tais ações ilícitas. Tudo isso terá um preço alto.

De fato, o Sudão pode ser apenas a primeira nação africana a implodir sob a influência russa. Na República Centro-Africana, Moçambique, Líbia e Mali, os mercenários russos trabalharam para reforçar os conflitos existentes, apoiar regimes despóticos, suprimir esforços em direção à democracia, saquear recursos naturais, garantir vantagem estratégica para Moscou e expulsar a influência ocidental. As forças desencadeadas por seus esforços não serão facilmente contidas.

*O Coronel (res) Richard Justin Kemp foi um oficial do Exército Britânico, que serviu de 1977 a 2006. Entre suas atribuições esteve o comando da Operação Fingal (presença britânica no Afeganistão) de julho a novembro de 2003. Entre suas mutas condecorações, Kemp recebeu a Ordem do Império Britânico, uma das maiores honrarias do Reino Unido.

Original: Vladimir Putin’s war has exploded into Sudan

Tradução e adaptação: Renato Henrique Marçal de Oliveira

Obs.: Enquanto EUA e Europa olham para o continente europeu e para a região do Indo-Pacífico, Rússia e China avançam a passos largos na África e América Latina.

Rússia e China vêm avançando bastante no continente africano. Guerras civis, como esta que pode estar começando no Sudão, infelizmente são algo comum na África, e os chineses e russos estão se aproveitando delas para avançar.

A China também vem avançando por meio das "armadilhas das dívidas".

Estas mudanças trazem novos desafios geopolíticos, mas também oportunidades, que o Brasil faria bem em aproveitar.


*Renato Henrique Marçal de Oliveira é químico e trabalha na Embrapa com pesquisas sobre gases de efeito estufa. Entusiasta e estudioso de assuntos militares desde os 10 anos de idade, escreve principalmente sobre armas leves, aviação militar e as IDF (Forças de Defesa de Israel)

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1 comentários:

  1. Todo tipo de conflito, seja entre pessoas, empresas ou nações, tem uma característica em comum... Você escolhe a data e hora dele começar, mas só termina quando o outro lado permite.

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