Dando continuidade as matérias especiais sobre nossa visita ao Complexo Naval de Itaguaí, onde tivemos contato com a construção dos nossos novos submarinos "Classe Riachuelo" (SBR), nesta matéria vamos abordar um tema muito elevante, e que marca uma nova visão não apenas da Marinha do Brasil, mas de nossas Forças Armadas com relação a aquisição de novos meios, e cumprindo o objetivo exposto em nossa Estratégia Nacional de Defesa (END), onde esta previsto que, toda aquisição deva envolver transferência de tecnologias, mais conhecido como pacote de "offset", visando não apenas a produção de componentes do objeto avo da aquisição, mas a capacitação técnica e expertise para que nossa indústria seja capaz de absorver os conhecimentos com relação a produção, assim como a capacidade de dar um passo adiante e desenvolver produtos com base no conhecimento adquirido neste "offset", representando um grande ganho ao país.
O PROSUB envolve um vasto pacote de transferência de tecnologias à nossa industria, sendo um fator estratégico com vistas a alcançar a plena capacidade de operação destes novos submarinos, com relativa independência dos fornecedores externos, bem como sendo um grande ativo a ser aplicado nos desenvolvimentos futuros, incluindo o futuro "SNBR".
Dentre os sistemas de grande importância estratégica em sua nacionalização, vamos citar três fundamentais em relação ao PROSUB, onde foi nos apresentado "casos" que nos mostram o quão desafiador é o processo que envolve "offset".
No primeiro exemplo, citamos a capacitação da NUCLEP para produção da seção de proa dos novos submarinos, processo o qual não detínhamos a capacidade técnica e o ferramental necessário para sua execução. Aqui cabe lembrar que, remontando o programa de aquisição e capacitação para construção local dos submarinos IKL (Classe Tupi), o mesmo teve sua seção de proa construída na Alemanha, tendo em vista que à época,não dispúnhamos do ferramental e meios técnicos necessários a construção daquela seção, e o custo para aquisição de uma prensa destinada a execução da curvatura das chapas desta seção apresentava uma relação custo-benefício proibitiva, principalmente devido a pequena demanda de produção destas seções, o que não justificaria naquele tempo o investimento.
A NUCLEP recebeu no âmbito do PROSUB, um vultoso investimento em ferramental e capacitação técnica, onde foram investidos cerca de 480 milhões, envolvendo também a aquisição da maior prensa hidráulica da América Latina, tendo sido desenvolvida especialmente para dobrar as chapas especiais destinadas a confecção de partes do casco resistente dos submarinos da "Classe Riachuelo" (SBR). Com uma capacidade de 80.000kN de força de prensagem e conformação a frio de chapas de aço com 5 polegadas de espessura, a instalação deste colosso envolveu um cuidadoso planejamento de engenharia para sua instalação, tendo em consideração suas grandes dimensões, somadas ao peso total do
equipamento superior a 1.200 toneladas, já dá para termos uma ideia do desafio para os engenheiros.
Essa nova capacidade produtiva conquistada através dos insumos oriundos do PROSUB, e a capacitação técnica envolvida no âmbito de offset, é um notável case de sucesso do programa, o que nos dará grande autonomia em relação a projetar e construir estruturas complexas, como as demandadas por um submarino convencional ou mesmo um submarino nuclear, como será o caso do nosso SNBR.
Outro ponto que apresentamos aqui, é o cancelamento do acordo de transferência de tecnologia por parte da francesa Jeumont, empresa que produz o Motor Elétrico Principal (MEP), o EPM Magtronic que gera 2.915 KW à 150 rpm, o qual seria nacionalizado pela WEG, que já foi selecionada para fornecer outros sistemas para o SBR. Porém, a empresa francesa levando em consideração o risco envolvido na transferência do seu know-how para uma empresa com o porte da WEG, preferiu não correr o risco de criar um futuro concorrente no seu nicho de atuação. Assim a Jeumont se recusou a participar do programa de offset.
Tal fato não impedirá o avanço da construção dos SBRs, porém, o desenvolvimento de um MEP nacional demandará mais tempo, o que tornará inviável sua aplicação nos quatro submarinos iniciais da "Classe Riachuelo". Este case mostra que o processo de "offset" é algo multo mais complexo do que imaginam alguns de nossos leitores, pois envolve não apenas a relação entre Estados, mas também vislumbram o interesse das empresas e grupos industriais envolvidos no âmbito do programa, algo que em determinados pontos é muito difícil de se conseguir obter um equilíbrio.
Por último e não menos importante, esta o case envolvendo a nacionalização das baterias que irão compor o sistema elétrico do SBR, trata-se de um dos mais importantes componentes desta fabulosa arma que é o submarino, pois sem essas, o mesmo fica sem capacidade de operar submerso abaixo da cota de periscópio, o que inviabiliza o emprego tático desta arma.
As baterias utilizadas no "Scorpene" são fabricadas pela empresa alemã Hagen, que pertence ao grupo Exide, que fabricará as primeiras unidades para o "Riachuelo" (SBR1) e o "Humaitá" (SBR-2) na Alemanha, pois o processo de offset que envolve as baterias, foi impactado pela instabilidade econômica e a crise política que atingiu o Brasil nos últimos anos, o que levou o Grupo Exide a cancelar o processo de transferência de tecnologia e a produção nacional destas para Marinha do Brasil.
O Grupo Exide já tinha contratado uma empresa brasileira como sua parceira, a Rondopar, que receberia dessa capacidade produtiva e ao longo do programa iria aumentando o percentual de nacionalização até atingir o nível de 100%. Era previsto inicialmente que o "Riachuelo" (SBR-1) receberia um conjunto de baterias produzido na Alemanha, e os submarinos posteriores receberiam gradativamente componentes produzidos aqui no Brasil, onde de acordo com os planos originais, o "Humaita" (SBR-2) contaria com um índice de 30%, o "Tonelero" (SBR-3) chegaria aos 60% e no último dos quatro submarinos previsto, o "Angostura" (SBR-4), esse índice de nacionalização chegaria finalmente aos 100%.
Diante desse imprevisto, a Marinha do Brasil teve que buscar uma solução a problemática que se apresentava, e foi ai que surgiu a NewPower, empresa que foi selecionada para desenvolver e produzir as baterias destinadas ao "SBR" no Brasil.
A empresa paulista detém o know-how no desenvolvimento e produção de baterias automotivas, industriais, estacionárias e tracionarias. Sendo fornecedora atual dos conjuntos de baterias empregados pelos nossos submarinos da "Classe Tupi", e já exporta também para outras marinhas que operam com submarinos IKL como o "Tupi". A Newpower conta com ferramental adquirido da extinta Saturnia, antiga fornecedora de baterias para os submarinos de nossa esquadra. Outro importante ativo, foi a contratação de muitos funcionários que fizeram parte do quadro técnico da extinta empresa, o que representou um enorme ganho e conhecimento e capacitação.
A Newpower já esta desenvolvendo as baterias que irão equipar os submarinos da "Classe Riachuelo", onde teve de ser feita a verticalização do processo, uma vez que a empresa teve que iniciar do zero. Mas, diferente do caso que envolve o MEP, as baterias já se encontram em fase avançada de desenvolvimento, com inclusive já tendo sido produzido um lote pré-série que será destinado aos testes de certificação, onde após uma série de avaliações rigorosas, a mesma sendo aprovada já terá sua produção iniciada. Segundo ao que nos foi dito durante a visita, o progresso esta sendo rápido e espera-se que a mesma já venha a equipar o "Tonelero" e o "Angostura", posteriormente substituindo as baterias importadas que estão previstas para o "Riachuelo" e o "Humaitá" conforme estas alcancem o fim de sua vida útil.
Esses são alguns exemplos para que se possa compreender um pouco o que envolve um programa da envergadura do PROSUB, onde muitos nos perguntaram com relação aos atrasos, onde posso afirmar que os mesmos são insignificantes diante do tamanho do desafio, e vou até um pouco além, afirmando que temos ganhado muito com o PROSUB, lembrando que ele não termina no comissionamento do "Angostura", mas dará inicio a era dos submarinos de propulsão nuclear (SNBR) na Marinha do Brasil.
Aqui deixo um especial agradecimento ao C.Alte Celso Mizutani Koga, que é o gerente de obtenção dos submarinos convencional e nuclear do programa, e que nos recebeu e acompanhou em nossa visita as instalações da UFEM e EBN.
Em breve o Cmte Farinazzo vai trazer mais um vídeo abordando nossa visita no Complexo Naval de Itaguaí, não percam, clique aqui e confira o trabalho primoroso de nosso parceiro no "Canal Arte da Guerra", e aguardem nossas próximas matérias sobre o PROSUB, vem muito mais por ai, essa visita nos garantiu um vasto conteúdo a ser compartilhado com vocês.
Por Angelo Nicolaci - Jornalista, editor do GBN News, graduando em Relações Internacionais pela UCAM, especialista em geopolítica, especialista em assuntos de defesa e segurança.
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