quarta-feira, 5 de novembro de 2025

"Operação FURNAS 2025": Carana em Ação – A Simulação Viva e a Excelência da Quick Reaction Force

No coração de Minas Gerais, entre 21 e 25 de outubro de 2025, o município de São José da Barra foi transformado em um país fictício: Carana. Com paisagens que iam de colinas e planícies a rios e áreas urbanas, o local virou palco de um dos exercícios mais desafiadores realizados pelo Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil. O objetivo? Preparar a Quick Reaction Force (QRF) e a Companhia de Desativação de Artefatos Explosivos (EOD Coy) para as complexas missões de paz da ONU.

Não se tratava apenas de um treinamento convencional. Cada detalhe do ambiente, desde as tensões étnicas e religiosas à insurgência armada, passando por diversos desafios, foi meticulosamente projetado pelos profissionais da Seção de Apoio a Operações de Paz (F-70)  do Comando da Força de Fuzileiros da Esquadra, para criar uma realidade quase palpável. Os 462 militares, incluindo 44 mulheres, se viram diante de decisões difíceis, crises simuladas e situações de emergência que poderiam muito bem acontecer em qualquer missão real de paz.


Carana: um país que ensina

Carana não é real, mas seus desafios são. Criado inicialmente pelo Departamento de Operações de Manutenção da Paz da ONU, o cenário é constantemente atualizado para refletir conflitos contemporâneos, com regiões como Leppko e servindo de palco para interações complexas entre civis, insurgentes e forças de paz.

Durante FURNAS 2025, a QRF precisou navegar por este ambiente dinâmico, equilibrando a atuação militar com a construção de confiança junto à população civil. Cada patrulha, cada escolta de comboios e cada negociação com atores fictícios exigia sensibilidade cultural, análise crítica e coordenação eficiente com ONGs e a própria ONU.

A simulação viva permitiu que os fuzileiros experimentassem, em tempo real, os desafios de tomada de decisão em cenários de alta pressão, onde informações incompletas ou contraditórias testavam sua capacidade de adaptação e resiliência.

Do treinamento à ação

O ciclo de preparação começou em 5 de agosto, nos Complexos Navais do Rio de Janeiro, com treinamentos progressivos conduzidos pelo 1º Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais e pelo Batalhão de Engenharia, em parceria com o Centro de Operações de Paz e Humanitário de Caráter Naval  (COpPazNav).

A cada semana, os militares eram desafiados com tarefas mais complexas: estabelecimento de bases temporárias, patrulhas e comboios, reconhecimento e vigilância, escoltas de civis, desativação de artefatos explosivos e evacuações médicas. Combinando exercícios reais e simulações virtuais (o chamado LVC – Live, Virtual, Constructive), o treinamento ofereceu uma imersão completa, permitindo avaliar decisões estratégicas e a capacidade de coordenação interagências.

O calor do exercício

Chegando a Carana, os fuzileiros se depararam com um cenário em que cada ação tinha consequências. Grupos insurgentes simulados espalhavam desinformação, atacavam comboios e ameaçavam civis, enquanto a população local observava desconfiada. Em meio a essa tensão, as mulheres fuzileiras navais assumiam funções críticas: negociação com civis, coleta de informações e mediação de conflitos, mostrando que a diversidade não era apenas ética, mas também estratégica.

A manhã começa com o ronco dos motores dos veículos blindados Piranha-IIIC, cortando uma estrada de Carana. De repente, uma explosão: uma mina anticarro abandonada detonou sob um dos blindados. A fumaça sobe, o silêncio é cortado pelos alertas de rádio e pela pronta resposta.

A tropa reage imediatamente. As equipes de socorro avançam para retirar os peacekeepers feridos, enquanto o EOD Coy se aproxima cautelosamente, identificando e neutralizando possíveis artefatos remanescentes. Cada movimento é calculado, cada passo, vital. O cenário é um teste de coordenação, precisão e resiliência, habilidades essenciais para qualquer missão de paz.

O alarme toca novamente. Um civil simulado, com um engenhoso artefato explosivo preso ao corpo, se aproxima da força de paz, pedindo ajuda. Um silêncio tenso se instala. O QRF e o EOD Coy precisam agir com rapidez e cautela

O dispositivo é complexo, semelhante aos armamentos improvisados usados por grupos extremistas. Cada passo da equipe é crítico. O tempo é inimigo. Comunicações rápidas, gestos claros, decisões precisas: neutralizar a ameaça sem colocar vidas em risco é a prioridade máxima. A tensão é palpável, e cada segundo conta.

Mais adiante, outra missão começa. Autoridades e representantes da UNESCO devem ser escoltados durante a repatriação de artefatos históricos de Carana. O QRF organiza cordões de segurança, avalia rotas e mantém vigilância constante.

A operação exige atenção total, equilíbrio entre proteção física e protocolos diplomáticos. Cada passo é monitorado, cada decisão, ponderada. A habilidade da tropa em combinar estratégia, vigilância e respeito às normas internacionais é posta à prova, mostrando que uma missão de paz exige mais do que força; exige inteligência e sensibilidade.

O último desafio do dia acontece na instalação de Desmobilização, Desarmamento e Reintegração (DDR). Relatórios indicam uma ameaça de bomba. A tensão aumenta, e a operação se torna uma coreografia de comunicação, coordenação e tomada de decisão sob pressão.

O QRF e o EOD Coy se mobilizam rapidamente. Patrulhas, perímetros de segurança, inspeções detalhadas: cada movimento é medido. A situação é complexa, refletindo o realismo de uma missão internacional, onde tática, diplomacia e proteção de vidas civis precisam caminhar lado a lado.

Jogos de guerra e aprendizagem estratégica

Além da simulação viva, o exercício incorporou jogos de guerra, onde líderes tomavam decisões estratégicas em cenários hipotéticos, analisando impactos políticos, humanitários e militares. Essa abordagem não só fortaleceu a capacidade de planejamento e adaptação mas também permitiu que os participantes experimentassem consequências de suas escolhas sem risco real, aprendendo a equilibrar segurança, respeito à cultura local e objetivos humanitários.

Lições de Carana

Ao final do exercício, ficou evidente que missões de paz não se resumem à presença militar. A experiência demonstrou que:

  • Confiança e respeito cultural são tão importantes quanto habilidades táticas;

  • Integração entre forças e atores humanitários maximiza a eficácia da missão;

  • Resiliência e capacidade de adaptação são essenciais diante de crises imprevisíveis;

  • Inclusão de gênero e diversidade enriquece a operação, trazendo perspectivas fundamentais para mediação e interação com a comunidade.

O exercício também reforçou a importância da projeção estratégica brasileira. Manter a QRF e a EOD Coy em prontidão certificada eleva a credibilidade do Brasil na ONU, garantindo que, quando chamado, o país possa contribuir de forma decisiva para a manutenção da paz global.

"FURNAS 2025" não foi apenas um exercício; foi uma imersão em um ambiente de complexidade sociopolítica, cultural e geográfica, onde cada fuzileiro naval pôde experimentar os desafios de uma missão de paz da ONU. Entre emboscadas simuladas, negociações delicadas e coordenação com civis e ONGs, ficou claro que a simulação viva e os jogos de guerra são ferramentas indispensáveis para formar tropas prontas, adaptáveis e conscientes de sua responsabilidade humanitária.

No final, Carana se revelou mais do que um cenário fictício: tornou-se uma aula prática de estratégia, liderança e resiliência, lembrando que, por trás de cada uniforme, há profissionais preparados para fazer a diferença em prol da paz.


por Angelo Nicolaci


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