sábado, 14 de junho de 2025

Ataque de Israel ao Irã expõe risco de escalada regional e falência da ordem internacional, avaliam especialistas da FESPSP

Análise da Escola de Sociologia e Política de São Paulo aponta consequências geopolíticas, impactos energéticos globais e o colapso das instituições multilaterais diante da crise.

O ataque aéreo conduzido por Israel contra o Irã, na madrugada de 13 de junho de 2025, marca um dos episódios mais críticos da já instável geopolítica do Oriente Médio nas últimas décadas. A operação israelense, com alvos precisos na instalação nuclear de Natanz e em posições estratégicas ligadas ao programa militar iraniano, resultou na morte de membros da Guarda Revolucionária e de cientistas nucleares. Em resposta, Teerã lançou uma ofensiva com drones contra o território israelense, prometeu novas retaliações e levou o caso ao Conselho de Segurança da ONU. Para analistas da Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o cenário atual representa uma mudança de fase no conflito Israel-Irã, com implicações de médio e longo prazo para a segurança regional, o comércio global e a estabilidade do sistema internacional.

Um ponto de inflexão estratégico no Oriente Médio

Segundo a professora Ana Carolina Marson, doutora em Relações Internacionais e docente da FESPSP, o ataque representa um divisor de águas. “O bombardeio da usina de enriquecimento de Natanz e a eliminação de lideranças-chave do programa nuclear iraniano indicam não apenas um ato de provocação, mas uma operação militar de forte caráter simbólico e estratégico”, afirma.

A especialista ressalta que, embora Israel justifique a ação como uma medida preventiva frente ao avanço do programa nuclear iraniano, a ofensiva eleva qualitativamente o nível de confrontação, criando um cenário de escalada quase inevitável. “Estamos diante de um conflito que passa de uma guerra por procuração e de sombras para um confronto aberto entre dois Estados, com potencial de arrastar a região para um ciclo de violência difícil de conter”, alerta Marson.

O dilema da legitimidade internacional de Israel

Outro ponto crítico, segundo a análise da FESPSP, é o custo político e diplomático para Israel. Mesmo reconhecendo que o Irã é visto por muitos atores internacionais como um Estado revisionista e isolado, a professora Ana Carolina lembra que ataques unilaterais, sobretudo contra instalações nucleares, tendem a ser duramente criticados em fóruns multilaterais.

A operação pode reforçar a percepção de Israel como um Estado agressor, afetando sua legitimidade internacional, inclusive entre aliados históricos. Caso a escalada continue, é possível que aumentem as pressões externas para limitar as ações militares israelenses”, observa.

A resposta estratégica do Irã: retaliação indireta e pressão econômica

O professor Alexandre Coelho, também doutor em Relações Internacionais pela FESPSP, avalia que o Irã buscará manter sua credibilidade estratégica através de ações graduais e calculadas, evitando um confronto aberto imediato. “O mais provável é que Teerã intensifique sua estratégia de retaliação indireta, utilizando forças por procuração como os Houthis no Iêmen e o Hezbollah no Líbano”, afirma.

Coelho também destaca a possibilidade de medidas com impacto direto na economia global, como a ameaça de bloqueio do Estreito de Ormuz, rota por onde transita cerca de 20% de todo o petróleo comercializado mundialmente. “Qualquer movimento nessa direção poderá elevar significativamente os preços internacionais da energia e gerar disrupções logísticas em cadeias comerciais estratégicas, afetando desde o transporte de combustíveis até o abastecimento de bens essenciais em diversos países”, alerta o especialista.

Além disso, Teerã poderá interferir nas rotas marítimas do Mar Vermelho e do Canal de Suez, ampliando o risco de uma crise logística global.

Estados Unidos, Rússia e China: a internacionalização da crise

A crise também acentua as linhas de polarização geopolítica global. Enquanto os Estados Unidos, embora oficialmente negando participação direta, foram previamente informados do ataque e reposicionaram ativos militares na região, a Rússia condenou abertamente a ação israelense e reiterou seu apoio ao Irã, evidenciando o aprofundamento das rivalidades estratégicas entre Moscou e Washington.

A China, por sua vez, acompanha a situação com grande preocupação, especialmente em relação à estabilidade do fornecimento energético e ao impacto nos corredores comerciais marítimos que ligam o Oriente Médio à Ásia. Analistas chineses já indicam que Pequim poderá intensificar esforços diplomáticos para evitar uma escalada que afete sua segurança energética.

O colapso do sistema multilateral de segurança

O episódio, segundo os professores da FESPSP, expõe de forma contundente a fragilidade das instituições multilaterais responsáveis por garantir a segurança internacional. O Conselho de Segurança da ONU permanece inerte, incapaz de aprovar qualquer medida efetiva de contenção. O protesto formal do Iraque, que denunciou a violação de seu espaço aéreo por caças israelenses, tampouco produziu respostas práticas.

Além disso, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) demonstrou sua impotência diante de ações militares contra instalações nucleares civis, reforçando a percepção de que o regime internacional de contenção nuclear está em colapso.

Estamos assistindo à consolidação de uma nova lógica internacional, em que a força militar direta se sobrepõe às instituições normativas e aos instrumentos de governança coletiva”, afirma Alexandre Coelho. Ele destaca ainda que a atual crise pode representar o início de uma nova era de relações internacionais marcada pela autodefesa armada e pelo enfraquecimento das regras de convivência internacional estabelecidas no pós-Segunda Guerra Mundial.

Uma nova era de instabilidade global?

O ataque israelense e suas consequências imediatas levantam questões de fundo sobre o futuro da ordem internacional. “Mais do que um episódio isolado, o que vemos é um sintoma do esgotamento de um modelo de segurança coletiva que, nas últimas décadas, já vinha sofrendo erosões sucessivas”, avalia Ana Carolina Marson.

Resta saber se os atores internacionais terão capacidade, ou vontade política, de reconstruir um mínimo de governança multilateral ou se o mundo caminha, de forma irreversível, para uma nova fase de realismo brutal, marcada pela lei do mais forte.


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Com Análise dos Professores Ana Carolina Marson e Alexandre Coelho, da FESPSP – Escola de Sociologia e Política de São Paulo

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