
O governo iraniano afirmou nesta terça-feira que espera uma resposta "rápida e positiva" da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) sobre o acordo nuclear assinado na véspera com Brasil e Turquia. Teerã afirmou ainda que as potências devem superar o ceticismo inicial, parar de buscar desculpas e aceitar os termos da troca de combustível nuclear.
As principais potências e membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) --Estados Unidos, Reino Unido, França e Rússia-- receberam com cautela a notícia do acordo e enfatizaram que o Irã ainda precisa provar os fins pacíficos de seu programa nuclear para evitar uma quarta rodada de sanções.
O quinto membro, a China, que já não aprovava as sanções, disse estar satisfeita com o acordo.
O acordo assinado ontem determina que o Irã envie 1.200 quilos de seu urânio enriquecido a 3,5%, em troca de 120 quilos de urânio enriquecido a 20% na Rússia ou França --suficiente para a produção de isótopos médicos em seus reatores e muito abaixo dos 90% necessários para uma bomba. O urânio enriquecido seria devolvido ao Irã no prazo de um ano.
A troca acontecerá na Turquia, país com proximidades com Ocidente e Irã, e sob supervisão da AIEA e vigilância iraniana e turca.
A troca de urânio iraniano em solo exterior era tema da proposta feita pelo grupo dos 5+1 (Estados Unidos, Reino Unido, França, China, Rússia e Alemanha) em outubro passado, sob mediação da AIEA. Na época, o Irã rejeitou a proposta por falta de garantias da entrega do urânio enriquecido e, em fevereiro passado, iniciou o enriquecimento de urânio a 20% em seu próprio território.
A medida, vetada ao Irã por resoluções do Conselho de Segurança, incitou uma campanha dos Estados Unidos por uma quarta rodada de sanções no órgão. Brasil e Turquia afirmaram repetidas vezes que o acordo encerra a necessidade das sanções.
"Se os países ocidentais continuarem buscando desculpas, ficará claro que eles não estão atrás de uma solução ao assunto e não têm opção lógica na mesa", disse o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores iraniano, Ramin Mehmanparast.
Em entrevista semanal a jornalistas, ele disse estar otimista de que o acordo avançará depois que os países tiverem mais tempo de avaliar o documento.
Enriquecimento
Boa parte do ceticismo das potências internacionais diz respeito às declarações do Irã de que continuará enriquecendo urânio a 20%, mesmo após o acordo.
Mehmanparast ressaltou hoje que o documento não está vinculado ao programa de enriquecimento iraniano. 'O acordo fechado ontem em Teerã aborda a troca de urânio de 3,5% por combustível nuclear a 20% e nada interfere no enriquecimento de urânio (no Irã)", disse.
"A troca do urânio além de criar confiança tem outro significado, dará ao Irã o direito de continuar com o enriquecimento", acrescentou.
Mehmanparast evitou esclarecer se o país está disposto a interromper o enriquecimento, como exigem as grandes potências.
Ceticismo
As grandes potências permaneceram céticas em relação ao acordo mediado por Brasil e Turquia, e analistas acham que o fato não resolverá a divisão internacional acerca desse assunto nem evitará a adoção de novas sanções da ONU a Teerã.
O Irã já sofreu três rodadas de sanções por causa do seu programa nuclear, apesar de insistir no caráter pacífico de suas atividades.
A proposta assinada em Teerã foi feita no ano passado pela ONU sob a premissa de que o Irã abandonaria o enriquecimento de urânio e ficaria mais distante de purificar o material radiativo até o grau necessário para o uso em armas.
Mas, após anunciar o acordo com Brasil e Turquia, o Irã informou que não pretende abandonar suas atividades de enriquecimento de urânio.
A Casa Branca disse que o Irã precisa dar outras provas do caráter pacífico do seu programa atômico. 'Diante do repetido fracasso do Irã em cumprir seus próprios compromissos (...), os Estados Unidos e a comunidade internacional continuam tendo sérias preocupações", disse um porta-voz. "Acho que estamos fazendo um sólido progresso a respeito de uma resolução com sanções."
Um porta-voz do Departamento de Estado norte-americano disse que Washington mantém o desejo de "se envolver com o Irã em qualquer lugar, a qualquer momento, desde que o Irã esteja preparado para tratar as preocupações da comunidade internacional a respeito do seu programa nuclear." Esse porta-voz disse que, enquanto isso, os EUA continuarão buscando novas sanções.
O Reino Unido afirmou que a preparação de novas sanções da ONU deve continuar, e que a adoção do acordo pelo Irã 'pode ser apenas mais uma tática protelatória", segundo o secretário (ministro) de Relações Exteriores, William Hague.
A AIEA, um órgão da ONU, tampouco se manifestou. Diplomatas disseram em Viena, onde fica a sede da agência, que aparentemente a AIEA não foi informada sobre os detalhes do acordo, anunciado em Teerã durante visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A França indicou que o acordo não vai resolver as principais questões.
"Não nos enganemos, uma solução para a questão (da troca de combustível), se acontecer, não fará nada para resolver o problema representado pelo programa nuclear iraniano", disse a chancelaria em nota.
O presidente russo, Dmitri Medvedev, manifestou preocupação semelhante. "Uma questão é: será que o Irã vai ele próprio enriquecer urânio? Até onde entendo por funcionários daquele Estado, tal atividade será continuada. Nesse caso (...), essas preocupações que a comunidade internacional tinha antes continuariam."
Medvedev discutiu por telefone o assunto com Lula e "avaliou positivamente os esforços conjuntos do Brasil e da Turquia para promover uma solução política e diplomática para o problema nuclear iraniano", segundo comunicado do Kremlin.
"Depois disso, precisamos decidir o que fazer: as propostas são suficientes ou é preciso algo mais? Então acho que uma pequena pausa nesse problema não faria mal nenhum", afirmou.
O presidente iraniano, Mamhoud Ahmadinejad, pediu ao 5+1 que reabram negociações com o seu país.
"Eles deveriam saudar o grande evento que ocorreu em Teerã e se distanciarem da atmosfera de pressão e sanções para criar uma oportunidade para a interação e a cooperação com o Irã."
Fonte: Folha
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